ACÓRDÃO Nº 000514/2020 PROCESSO Nº 0140692017-7
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
PROCESSO Nº 0140692017-7
SEGUNDA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS - GEJUP
Recorrida: KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME
Preparadora: UNIDADE DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA SEFAZ – SANTA LUZIA
Autuante: ARTUR MENDONÇA CAVALCANTI
Relator: CONS.º SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA
OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS –– CONTA MERCADORIAS – INAPLICABILIDADE DA TÉCNICA PARA CONTRIBUINTES DO SIMPLES NACIONAL – IMPROCEDÊNCIA DA ACUSAÇÃO – LEVANTAMENTO FINANCEIRO – EXCLUSÃO DO MONTANTE RELATIVO AO PREJUÍZO BRUTO COM MERCADORIAS SUJEITAS À SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA, ISENTAS OU NÃO TRIBUTADAS APURADAS POR MEIO DA CONTA MERCADORIAS - INFRAÇÃO NÃO CONFIGURADA – INTERDIÇÃO – SUSPENSÃO MOMENTÂNEA DO AUTO DE INFRAÇÃO – AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL - REFORMADA DE OFÍCIO A DECISÃO RECORRIDA – AUTO DE INFRAÇÃO IMPROCEDENTE – RECURSO DE OFÍCIO DESPROVIDO
- Impossibilidade de suspensão dos prazos processuais em decorrência de interdição do sujeito passivo ante a ausência de previsão legal.
- A técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido não é aplicável para contribuinte do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06. O contribuinte enquadrado como Simples Nacional possui características e regramento próprios, que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.
- A ocorrência de desembolsos em valores superiores às receitas auferidas no período, constatados por meio do Levantamento Financeiro, autoriza, nos termos do artigo 646, parágrafo único do RICMS/PB, a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o devido pagamento do imposto. In casu, as provas anexadas aos autos atestam que o contribuinte suportou prejuízo bruto, no exercício de 2014, em relação às mercadorias sujeitas à substituição tributária, isentas ou não tributadas, ensejando a correção do Levantamento Financeiro. Após a consolidação dos dados, ficou constatada a inexistência de diferença tributável, situação que fez sucumbir o crédito tributário originalmente lançado.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da Segunda Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o VOTO pelo recebimento do recurso de ofício, por regular, e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento. Contudo, em observância à jurisprudência desta Corte, reformo, de ofício, a decisão singular para julgar improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000134/2017-14, lavrado em 26 de janeiro de 2017 contra a empresa KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME, eximindo-a de quaisquer ônus decorrentes do presente processo.
Intimações a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar, as quais também devem ser remetidas para o seguinte endereço: Rua Senador Rui Carneiro, nº 301, São Vicente do Seridó - PB, conforme requerido às fls. 24.
P.R.I.
Segunda Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 16 de dezembro de 2020.
SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA
Conselheiro Relator
LEONILSON LINS DE LUCENA
Presidente
Participaram do presente julgamento os membros da Segunda Câmara de Julgamento, JOSÉ ERIELSON ALMEIDA DO NASCIMENTO (SUPLENTE), PAULO EDUARDO DE FIGUEIREDO CHACON, LARISSA MENESES DE ALMEIDA (SUPLENTE) E RODRIDO DE QUEIROZ NÓBREGA.
FRANCISCO GLAUBERTO BEZERRA JÚNIOR
Assessor Jurídico
Relatório
Por meio do Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000134/2017-14, lavrado em 26 de janeiro de 2017 contra a empresa KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME, inscrição estadual nº 16.203.970-0, o auditor fiscal responsável pelo cumprimento da Ordem de Serviço Normal nº 93300008.12.00002283/2016-97 denuncia o sujeito passivo de haver cometido as seguintes infrações, ipsis litteris:
0027 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis, resultando na falta de recolhimento do ICMS. Irregularidade esta detectada através do levantamento Conta Mercadorias.
0021 - OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS - LEVANTAMENTO FINANCEIRO >> O contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido, tendo em vista a constatação de que os pagamentos efetuados superaram as receitas auferidas. Irregularidade esta detectada através de Levantamento Financeiro.
Em decorrência destes fatos, o representante fazendário, considerando haver o contribuinte infringido os artigos 158, I; 160, I; c/ fulcro nos artigos 643, § 4º, II e 646, parágrafo único, todos do RICMS/PB, lançou um crédito tributário na quantia total de R$ 333.900,66 (trezentos e trinta e três mil, novecentos reais e sessenta e seis centavos), sendo R$ 166.950,33 (cento e sessenta e seis mil, novecentos e cinquenta reais e trinta e três centavos) de ICMS e R$ 166.950,33 (cento e sessenta e seis mil, novecentos e cinquenta reais e trinta e três centavos) a título de multas por infração, com fulcro no artigo 82, V, “a” e “f”, da Lei nº 6.379/96.
Documentos instrutórios juntados às fls. 4 a 20.
Depois de cientificada por via postal em 7 de março de 2017, a autuada, por intermédio de sua advogada, protocolou, em 7 de abril de 2017, impugnação contra os lançamentos dos créditos tributários consignados no Auto de Infração em análise, por meio da qual informa que a empresa é uma firma individual, cujo titular se encontra em estado de interdição por parte do poder judiciário.
Considerando o fato narrado, a impugnante requereu suspensão momentânea dos efeitos do Auto de Infração em tela, até o restabelecimento do titular da empresa, após levantamento do Termo de Curatela.
Com a informação de inexistência de antecedentes fiscais (fls. 31), foram os autos conclusos (fls. 32) e remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais – GEJUP.
Considerando o disposto no artigo 67 da Lei nº 10.094/13, o assessor técnico da GEJUP retornou os autos à repartição preparadora, uma vez que identificara que a peça impugnatória teria sido intempestiva.
Em resposta ao despacho exarado às fls. 34, o coletor de Juazeirinho solicitou a realização de nova análise do documento anexado ao processo às fls. 21, tendo em vista que a data de recebimento do AR foi omitida no documento, passando a data da ciência para cinco dias após a entrega do aviso de recebimento, conforme reza o art. 11, § 3º, II, da Lei nº 10.094/13, ou seja, no caso em questão, o dia 12 de março de 2017.
Retornando os autos à GEJUP, estes foram distribuídos ao julgador fiscal João Lincoln Diniz Borges, que, após reconhecer a tempestividade da impugnação, decidiu pela parcial procedência da exigência fiscal, nos termos da seguinte ementa:
OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. CONTA MERCADORIAS. PROCEDÊNCIA. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. EXPURGO DE OPERAÇÃO SUJEITA À SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA, ISENTA E/OU NÃO TRIBUTADA. FALTA DE REPERCUSSÃO TRIBUTÁRIA. IMPROCEDÊNCIA. FALTA DE PREVISÃO LEGAL PARA SUSPENSÃO MOMENTÂNEA DO AUTO DE INFRAÇÃO. DENÚNCIAS COMPROVADAS EM PARTE.
- Inaplicabilidade do pleito de suspensão momentânea do lançamento indiciário em face da ocorrência de Curatela Provisória Judicial, diante da falta de previsão legal em relação às hipóteses previstas no CTN, bem como no Ordenamento Processual Tributário disposto pela Lei nº 10.094/13.
- Cabe a exigência tributária formulada pela acusação de omissão de saídas de mercadorias tributáveis através do Levantamento da Conta Mercadorias, ante a falta de argumentos e provas materiais capazes de elidir a irregularidade fiscal apurada.
- Improcedência da exigência fiscal apurada no levantamento financeiro, diante da constatação de prejuízo bruto em monta superior ao déficit financeiro apurado, restando comprometida a repercussão tributária nos termos do artigo 646, parágrafo único do RICMS/PB.
AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE EM PARTE
Em observância ao que determina o artigo 80 da Lei nº 10.094/13, o julgador fiscal recorreu de sua decisão.
Cientificada da decisão proferida pela instância prima em 22 de julho de 2019, a autuada não mais se manifestou nos autos.
Remetidos ao Conselho de Recursos Fiscais, foram os autos distribuídos a esta relatoria, segundo os critérios regimentais, para apreciação e julgamento.
Eis o relatório.
VOTO |
A quaestio juris versa sobre as seguintes denúncias: a) omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Conta Mercadorias nos exercícios de 2013 e 2015 e b) omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Levantamento Financeiro, identificada no ano de 2014, formalizadas contra a empresa KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME, já devidamente qualificada nos autos.
Estas condutas, nos termos da legislação de regência, fizeram surgir a presunção de omissão de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto correspondente, fato este que motivou o lançamento de ofício.
Passemos à análise individualizada das acusações.
0027 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS (EXERCÍCIOS DE 2013 E 2015)
A Conta Mercadorias – Lucro Presumido é uma técnica fiscal que se aplica aos casos em que o contribuinte não possui contabilidade regular, circunstância em que se arbitra o lucro de 30% (trinta por cento) sobre o Custo das Mercadorias Vendidas - CMV. Caso o valor das vendas seja inferior ao CMV acrescido deste percentual de lucro, a legislação tributária estadual autoriza a fiscalização a lançar mão da presunção de que houve saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto, nos termos do que dispõem os artigos 3º, § 9º, da Lei nº 6.379/96; 643, § 4º, II e 646 do RICMS/PB[1], in verbis:
Lei nº 6.379/96:
Art. 3º O imposto incide sobre:
(...)
§ 8º O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa e bancos, suprimentos a caixa e bancos não comprovados ou a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou de prestações de serviços sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.
§ 9º A presunção de que cuida o § 8º, aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, assim como a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados ou Vendidos, conforme o caso.
RICMS/PB:
Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.
(...)
§ 3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, será exigido o livro Caixa, devidamente autenticado pela repartição fiscal do domicílio do contribuinte, com a escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês.
§ 4º Para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couber, os procedimentos abaixo, dentre outros, cujas repercussões são acolhidas por este Regulamento:
I - a elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como considerada a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;
II - o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.
(...)
Art. 646. Autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção:
I – o fato de a escrituração indicar:
a) insuficiência de caixa;
b) suprimentos a caixa ou a bancos, não comprovados;
II – a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes;
III – qualquer desembolso não registrado no Caixa;
IV – a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas;
V – declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito.
Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, bem como, a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados , quando da transferência ou venda, conforme o caso.
Por imperativo legal, a constatação desta omissão obriga o auditor fiscal a lançar, de ofício, o crédito tributário decorrente desta infração, tendo em vista a receita marginal originária das saídas omitidas afrontar o disciplinamento contido nos art. 158, I, e art. 160, I, ambos do RICMS/PB, os quais transcrevemos a seguir:
Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:
I - sempre que promoverem saída de mercadorias;
Art. 160. A nota fiscal será emitida:
I - antes de iniciada a saída das mercadorias;
Como forma de garantir efetividade ao comando insculpido nos dispositivos anteriormente reproduzidos, a Lei nº 6.379/96, em seu artigo 82, V, “a”, estabeleceu a penalidade aplicável àqueles que violarem as disposições neles contidas.
Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:
(...)
V - de 100% (cem por cento):
a) aos que deixarem de emitir nota fiscal pela entrada ou saída de mercadorias, de venda a consumidor ou de serviço, ou as emitirem sem observância dos requisitos legais;
A presunção de que trata o artigo 646 do RICMS/PB, contudo, é relativa, cabendo ao contribuinte a prova da sua improcedência, conforme prevê a parte final do caput do referido artigo.
Em razão de não haver sido apresentado recurso voluntário, o efeito devolutivo restringir-se-á à análise dos termos da decisão singular.
Primeiramente, devemos observar que, durante o período dos fatos geradores, a empresa estava enquadrada como Simples Nacional, conforme atesta o extrato da consulta ao Dossiê do Contribuinte do Sistema ATF da Secretaria de Estado da Fazenda da Paraíba:
Início |
Término |
Razão social |
Situação cadastral |
Natureza jurídica |
Tipo de estabelecimento |
Tipo de unidade |
Regime de apuração |
Município |
18/09/2012 |
02/04/2014 |
KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS |
ATIVO |
EMPRESÁRIO (INDIVIDUAL) |
MATRIZ |
UNIDADE PRODUTIVA |
SIMPLES NACIONAL |
SAO VICENTE DO SERIDO |
02/04/2014 |
01/01/2018 |
KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME |
ATIVO |
EMPRESÁRIO (INDIVIDUAL) |
MATRIZ |
UNIDADE PRODUTIVA |
SIMPLES NACIONAL |
SAO VICENTE DO SERIDO |
01/01/2018 |
04/01/2018 |
KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME |
ATIVO |
EMPRESÁRIO (INDIVIDUAL) |
MATRIZ |
UNIDADE PRODUTIVA |
NORMAL |
SAO VICENTE DO SERIDO |
04/01/2018 |
--- |
KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME |
SUSPENSO |
EMPRESÁRIO (INDIVIDUAL) |
MATRIZ |
UNIDADE PRODUTIVA |
NORMAL |
SAO VICENTE DO SERIDO |
Repiso que a acusação descrita no Auto de Infração teve, como fato motivador, a identificação de omissões de saídas de mercadorias tributáveis, detectadas pela fiscalização quando do levantamento das Contas Mercadorias relativas aos exercícios de 2013 e 2015.
Não podemos perder de vista que a LC nº 123/06, em seu artigo 34, não deixa dúvidas acerca da aplicação das presunções de omissão de receitas para contribuintes do Simples Nacional.
Art. 34. Aplicam-se à microempresa e à empresa de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional todas as presunções de omissão de receita existentes nas legislações de regência dos impostos e contribuições incluídos no Simples Nacional.
Pois bem. A Lei Complementar nº 123/06, em seu artigo 13, § 1º, “f”, determina que, nas operações ou prestações desacobertadas de documento fiscal (omissão de receitas), seja aplicada a legislação tributária atribuída às demais pessoas jurídicas. A clareza do texto normativo não exige do hermeneuta maiores esforços interpretativos. Senão vejamos:
Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:
(...)
§ 1o O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:
(...)
XIII - ICMS devido:
(...)
f) na operação ou prestação desacobertada de documento fiscal; (g. n.)
O comando insculpido no dispositivo acima transcrito não deixa dúvidas quanto à necessidade de deslocamento da sistemática de apuração do ICMS para o regime geral quando o contribuinte, enquadrado como Simples Nacional, realiza quaisquer das condutas descritas no inciso XIII do § 1º do artigo 13 da Lei Complementar nº 123/2006.
Não obstante o fato de restar demonstrada a possibilidade de se exigir, de contribuinte enquadrado como Simples Nacional, ICMS em razão de omissão de receitas, vislumbro, no caso em tela, uma questão de essencial relevância que prejudicou o lançamento em sua integralidade, a saber: a técnica aplicada.
Imperativo salientarmos mais uma vez que o que se está a discutir não é a omissão em si, mas a técnica da Conta Mercadorias para contribuinte do Simples Nacional, pelo fato de a LC nº 123/06 se mostrar incompatível com o procedimento realizado pela auditoria.
Em tempo: para os demais contribuintes, a técnica revela-se plenamente eficaz, apropriada e dotada de validade jurídica para embasar a acusação. O alcance deste entendimento é, portanto, hermético, não autorizando ampliações para situações outras.
Noutras palavras, o que se está a buscar é a compatibilização da legislação estadual com a Lei Complementar nº 123/06.
Assim como recorremos à lei especial para justificar a possibilidade de aplicação da legislação afeta às demais pessoas jurídicas para os casos de omissão de receitas, também o fazemos para sustentar a imprestabilidade da técnica utilizada (Conta Mercadorias) para dar arrimo à acusação em comento.
É cediço que a LC nº 123/06 instituiu tratamento diferenciado para os contribuintes que se amoldarem às condições nela estabelecidas e fizerem opção por este regime diferenciado. Neste norte, a partir da inclusão do contribuinte na sistemática do Simples Nacional, o regramento especial passa a produzir efeitos para o sujeito passivo, assim como para o Fisco. Não se quer dizer com isso que os demais normativos não lhe sejam aplicáveis. O que se afirma é que se deve observar se a norma se harmoniza com a LC nº 123/06.
Posto de outra forma - e já adentrando no caso concreto -, para que se possa validar o procedimento fiscal que resultou na identificação de omissão de receitas, faz-se mister analisarmos se os procedimentos da Conta Mercadorias são compatíveis com o regramento especial.
O RICMS/PB, em seu artigo 643, §§ 3º e § 4º, disciplina que, no exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couberem, os seguintes procedimentos:
a) Elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;
b) Levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.
Ao dispor acerca deste último procedimento, o RICMS/PB, ao estabelecer percentual (30%) a ser acrescido ao Custo de Mercadorias Vendidas, mostra-se claramente em dissonância com a sistemática estabelecida pela LC nº 123/06.
O contribuinte enquadrado como Simples Nacional recolhe o tributo devido sobre o seu faturamento, em observância ao que estabelece o artigo 18, § 3º, da LC nº 123/06:
Art. 18. O valor devido mensalmente pela microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional será determinado mediante aplicação das alíquotas efetivas, calculadas a partir das alíquotas nominais constantes das tabelas dos Anexos I a V desta Lei Complementar, sobre a base de cálculo de que trata o § 3o deste artigo, observado o disposto no § 15 do art. 3º.
(...)
§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota determinada na forma do caput e dos §§ 1º e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário.
§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota efetiva determinada na forma do caput e dos §§ 1º, 1º-A e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário. (Redação dada pela Lei Complementar nº 155, de 2016)
Assim, o contribuinte que apura e recolhe o tributo com base nos dispositivos acima reproduzidos, estará em situação regular quanto à obrigação principal, à luz da LC nº 123/06.
A cobrança de tributos, por força do que estabelece o artigo 3º do Código Tributário Nacional, é uma atividade administrativa vinculada, não sendo possível ao auditor fiscal agir de forma discricionária.
Esta ressalva se faz necessária para explicar que, no caso em comento, não estamos afastando a aplicabilidade do artigo 643, § 4º, do RICMS/PB, tampouco deixando ao talante da autoridade fiscal a possibilidade de “escolher” quando utilizá-la. Uma análise mais atenta do dispositivo citado nos permite concluir que a solução para a questão se extrai do § 4º do referido artigo. Vejamos:
Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.
(...)
§ 3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, será exigido o livro Caixa, devidamente autenticado pela repartição fiscal do domicílio do contribuinte, com a escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês.
§ 4º Para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couber, os procedimentos abaixo, dentre outros, cujas repercussões são acolhidas por este Regulamento:
I - a elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como considerada a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;
II - o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24. (g. n.)
Partindo do princípio de que a lei não contém palavras inúteis, a expressão “onde couber” indica que os procedimentos previstos nos incisos I e II do § 4º do artigo 643 do RICMS/PB não são obrigatórios para todo e qualquer exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular.
Este comando, portanto, não é taxativo e não vincula o auditor fiscal a adotá-los em todas as situações, mas somente nos casos em que “couberem”.
O contribuinte enquadrado como Simples Nacional, como já demonstrado, possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.
Na LC nº 123/06, não há qualquer exigência neste sentido para fins de tributação. Apenas no inciso X do seu artigo 29 consta uma referência ao lucro bruto – ainda que de forma indireta -, contudo para efeito de exclusão do regime.
Art. 29. A exclusão de ofício das empresas optantes pelo Simples Nacional dar-se-á quando:
(...)
X – for constatado que durante o ano-calendário o valor das aquisições de mercadorias para comercialização ou industrialização, ressalvadas hipóteses justificadas de aumento de estoque, for superior a 80% (oitenta por cento) dos ingressos de recursos no mesmo período, excluído o ano de início de atividade;
Somente depois de excluído do Simples Nacional, o Fisco está autorizado a lançar mão da Conta Mercadorias – Lucro Presumido para aqueles que não detenham escrita contábil, o que não implica dizer que o contribuinte, enquanto enquadrado na sistemática da LC nº 123/06, esteja “blindado”. A fiscalização tem o poder-dever de verificar a regularidade das operações do contribuinte, utilizando-se, para tanto, dos demais recursos de que dispõe para cumprir o seu mister.
Este entendimento, registre-se, encontra eco em diversas decisões proferidas pelo Conselho de Recursos Fiscais.
Diante de todo o exposto e em observância à jurisprudência desta Corte, reformo, de ofício, a decisão singular e declaro improcedente a acusação de omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Conta Mercadorias.
0021 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – LEVANTAMENTO FINANCEIRO ( EXERCÍCIO DE 2014)
A acusação ora em comento originou-se a partir da técnica de fiscalização denominada LEVANTAMENTO FINANCEIRO, cujo mecanismo de aferição proporciona analisar se houve equilíbrio entre os somatórios dos desembolsos e o total das receitas auferidas no mesmo exercício, repercutindo em omissão de vendas sempre que as despesas superarem as receitas. Nesta hipótese, a legislação vigente autoriza a fiscalização a se valer da presunção juris tantum de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, arrimado no parágrafo único do art. 646 do RICMS/PB, já reproduzido anteriormente.
Nesta esteira, considerando haver o contribuinte infringido a legislação tributária no exercício de 2014, o auditor fiscal responsável pela lavratura do Auto de Infração em tela, propôs, como medida punitiva, a aplicação da multa insculpida no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96, in verbis:
Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:
(...)
V - de 100% (cem por cento):
(...)
f) aos que deixarem de recolher o imposto proveniente de saída de mercadoria, dissimulada por receita de origem não comprovada, inclusive a representada por despesa realizada a descoberto de caixa, pela existência de passivo fictício ou por qualquer forma apurada através de levantamento da escrita contábil;
O nobre julgador singular, ao se debruçar sobre o caderno processual, identificou que, na Conta Mercadorias do exercício de 2014 (fls. 10), fora apurado um prejuízo bruto relativo às operações com mercadorias com substituição tributária, isentas e/ou não tributadas no valor de R$ 296.152,75 (duzentos e noventa e seis mil, cento e cinquenta e dois reais e setenta e cinco centavos).
Ao se defrontar com esta situação, com o objetivo de corrigir possíveis superavaliações dos créditos tributários identificados nos Levantamentos Financeiros, o diligente julgador fiscal procedeu aos ajustes necessários, expurgando, do montante tributável do exercício de 2014, a correspondente parcela do prejuízo bruto da Conta Mercadorias referente aos produtos com substituição tributária, isentos e não tributados.
Esta conduta vem sendo observada pelas instâncias administrativas de julgamento da Secretaria de Estado da Fazenda da Paraíba como forma de se evitar o bis in idem, a exemplo da decisão proferida por meio do Acórdão nº 481/2017 da relatoria do Cons.º João Lincoln Diniz Borges, cuja ementa reproduzimos a seguir:
OMISSÃO DE VENDAS. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. PROVAS DOCUMENTAIS DA EXSTÊNCIA DE SALDOS BANCÁRIOS E DE DUPLICATAS A PAGAR. AJUSTES REALIZADOS. EXPURGO DE OPERAÇÕES SUJEITAS À SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA, ISENTA E/OU NÃO TRIBUTADA. FALTA DE REPERCUSSÃO TRIBUTÁRIA AUTO DE INFRAÇÃO IMPROCEDENTE. REFORMADA A DECISÃO SINGULAR. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO E VOLUNTÁRIO PROVIDO.
Diferença tributável apurada por meio do Levantamento Financeiro caracteriza a presunção legal de que houve omissões de saídas de mercadorias tributáveis, sem o pagamento do imposto devido. In casu, a apresentação de provas documentais acerca da existência de saldos bancários e de duplicatas a pagar, não consideradas no procedimento inicial, além da constatação de prejuízo bruto com mercadorias sujeitas à substituição tributária e/ou não tributadas apurado em levantamento da Conta Mercadorias, fizeram derrocar a exigência fiscal apoiada na presunção esculpida no ordenamento tributário.
Tendo em vista que o valor a ser deduzido (R$ 296.152,75) é superior à diferença tributável registrada no Levantamento Financeiro (R$ 206.235,19), a repercussão tributária não mais se evidencia para o exercício de 2014.
Sendo assim, sem mais a acrescentar, ratifico os termos da decisão recorrida quanto à acusação de omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Levantamento Financeiro.
É imprescindível atentarmos que, aos contribuintes que não mais se encontrem com inscrição estadual ativa, a Lei nº 10.094/13, em seu artigo 11, § 10, atribui ao sócio administrador da empresa ou ao representante legal constante no Cadastro de Contribuintes do ICMS a prerrogativa de indicar endereço no Processo Administrativo Tributário para intimação dos atos referentes ao processo do qual seja parte.
Art. 11. Far-se-á a intimação:
(...)
II - por via postal, com Aviso de Recebimento (AR), encaminhado ao domicílio tributário do sujeito passivo, observados os §§ 2º, 9º e 10 deste artigo;
(...)
§ 9º Para efeitos do disposto no inciso II do “caput” deste artigo, a intimação, quando o sujeito passivo não estiver com sua inscrição ativa perante o Cadastro de Contribuintes do ICMS do Estado, deverá ser realizada:
I - no endereço do sócio administrador da empresa;
II - no endereço do representante legal constante no Cadastro de Contribuintes do ICMS, caso a pessoa jurídica não tenha sócio administrador;
III - por edital, publicado no Diário Oficial Eletrônico - DOe-SER, no caso de devolução do Aviso de Recebimento (AR) sem lograr êxito na entrega da intimação, nos termos dos incisos I e II deste parágrafo.
Acrescido o § 10 ao art. 11 pela alínea “a” do inciso II do art. 5º da Lei nº 11.247/18 - DOE de 14.12.18. OBS: efeitos a partir de 1º de janeiro de 2019.
§ 10. Para efeitos do § 9º e em caso de endereço desatualizado no CCICMS/PB, fica facultado ao sócio administrador da empresa ou ao representante legal constante no Cadastro de Contribuintes do ICMS indicar endereço no Processo Administrativo Tributário para intimação dos atos referentes a este Processo. (g. n.)
Atendidas as condições estabelecidas nos §§ 9º e 10 do artigo 11 da Lei nº 10.094/13, é inegável que assiste ao contribuinte o direito de indicar endereço para recebimento de intimações/notificações relativas ao Processo nº 0140692017-7.
Registre-se que a solicitação fora expressamente formulada na impugnação (fls. 24).
Com estes fundamentos,
VOTO pelo recebimento do recurso de ofício, por regular, e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento. Contudo, em observância à jurisprudência desta Corte, reformo, de ofício, a decisão singular para julgar improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000134/2017-14, lavrado em 26 de janeiro de 2017 contra a empresa KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME, eximindo-a de quaisquer ônus decorrentes do presente processo.
Intimações a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar, as quais também devem ser remetidas para o seguinte endereço: Rua Senador Rui Carneiro, nº 301, São Vicente do Seridó - PB, conforme requerido às fls. 24.
Segunda Câmara de Julgamento, sessão realizada por meio de videoconferência em 16 de dezembro de 2020.
Sidney Watson Fagundes da Silva
Conselheiro Relator
Por meio do Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000134/2017-14, lavrado em 26 de janeiro de 2017 contra a empresa KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME, inscrição estadual nº 16.203.970-0, o auditor fiscal responsável pelo cumprimento da Ordem de Serviço Normal nº 93300008.12.00002283/2016-97 denuncia o sujeito passivo de haver cometido as seguintes infrações, ipsis litteris:
0027 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis, resultando na falta de recolhimento do ICMS. Irregularidade esta detectada através do levantamento Conta Mercadorias.
0021 - OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS - LEVANTAMENTO FINANCEIRO >> O contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido, tendo em vista a constatação de que os pagamentos efetuados superaram as receitas auferidas. Irregularidade esta detectada através de Levantamento Financeiro.
Em decorrência destes fatos, o representante fazendário, considerando haver o contribuinte infringido os artigos 158, I; 160, I; c/ fulcro nos artigos 643, § 4º, II e 646, parágrafo único, todos do RICMS/PB, lançou um crédito tributário na quantia total de R$ 333.900,66 (trezentos e trinta e três mil, novecentos reais e sessenta e seis centavos), sendo R$ 166.950,33 (cento e sessenta e seis mil, novecentos e cinquenta reais e trinta e três centavos) de ICMS e R$ 166.950,33 (cento e sessenta e seis mil, novecentos e cinquenta reais e trinta e três centavos) a título de multas por infração, com fulcro no artigo 82, V, “a” e “f”, da Lei nº 6.379/96.
Documentos instrutórios juntados às fls. 4 a 20.
Depois de cientificada por via postal em 7 de março de 2017, a autuada, por intermédio de sua advogada, protocolou, em 7 de abril de 2017, impugnação contra os lançamentos dos créditos tributários consignados no Auto de Infração em análise, por meio da qual informa que a empresa é uma firma individual, cujo titular se encontra em estado de interdição por parte do poder judiciário.
Considerando o fato narrado, a impugnante requereu suspensão momentânea dos efeitos do Auto de Infração em tela, até o restabelecimento do titular da empresa, após levantamento do Termo de Curatela.
Com a informação de inexistência de antecedentes fiscais (fls. 31), foram os autos conclusos (fls. 32) e remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais – GEJUP.
Considerando o disposto no artigo 67 da Lei nº 10.094/13, o assessor técnico da GEJUP retornou os autos à repartição preparadora, uma vez que identificara que a peça impugnatória teria sido intempestiva.
Em resposta ao despacho exarado às fls. 34, o coletor de Juazeirinho solicitou a realização de nova análise do documento anexado ao processo às fls. 21, tendo em vista que a data de recebimento do AR foi omitida no documento, passando a data da ciência para cinco dias após a entrega do aviso de recebimento, conforme reza o art. 11, § 3º, II, da Lei nº 10.094/13, ou seja, no caso em questão, o dia 12 de março de 2017.
Retornando os autos à GEJUP, estes foram distribuídos ao julgador fiscal João Lincoln Diniz Borges, que, após reconhecer a tempestividade da impugnação, decidiu pela parcial procedência da exigência fiscal, nos termos da seguinte ementa:
OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. CONTA MERCADORIAS. PROCEDÊNCIA. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. EXPURGO DE OPERAÇÃO SUJEITA À SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA, ISENTA E/OU NÃO TRIBUTADA. FALTA DE REPERCUSSÃO TRIBUTÁRIA. IMPROCEDÊNCIA. FALTA DE PREVISÃO LEGAL PARA SUSPENSÃO MOMENTÂNEA DO AUTO DE INFRAÇÃO. DENÚNCIAS COMPROVADAS EM PARTE.
- Inaplicabilidade do pleito de suspensão momentânea do lançamento indiciário em face da ocorrência de Curatela Provisória Judicial, diante da falta de previsão legal em relação às hipóteses previstas no CTN, bem como no Ordenamento Processual Tributário disposto pela Lei nº 10.094/13.
- Cabe a exigência tributária formulada pela acusação de omissão de saídas de mercadorias tributáveis através do Levantamento da Conta Mercadorias, ante a falta de argumentos e provas materiais capazes de elidir a irregularidade fiscal apurada.
- Improcedência da exigência fiscal apurada no levantamento financeiro, diante da constatação de prejuízo bruto em monta superior ao déficit financeiro apurado, restando comprometida a repercussão tributária nos termos do artigo 646, parágrafo único do RICMS/PB.
AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE EM PARTE
Em observância ao que determina o artigo 80 da Lei nº 10.094/13, o julgador fiscal recorreu de sua decisão.
Cientificada da decisão proferida pela instância prima em 22 de julho de 2019, a autuada não mais se manifestou nos autos.
Remetidos ao Conselho de Recursos Fiscais, foram os autos distribuídos a esta relatoria, segundo os critérios regimentais, para apreciação e julgamento.
Eis o relatório.
VOTO |
A quaestio juris versa sobre as seguintes denúncias: a) omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Conta Mercadorias nos exercícios de 2013 e 2015 e b) omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Levantamento Financeiro, identificada no ano de 2014, formalizadas contra a empresa KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME, já devidamente qualificada nos autos.
Estas condutas, nos termos da legislação de regência, fizeram surgir a presunção de omissão de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto correspondente, fato este que motivou o lançamento de ofício.
Passemos à análise individualizada das acusações.
0027 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS (EXERCÍCIOS DE 2013 E 2015)
A Conta Mercadorias – Lucro Presumido é uma técnica fiscal que se aplica aos casos em que o contribuinte não possui contabilidade regular, circunstância em que se arbitra o lucro de 30% (trinta por cento) sobre o Custo das Mercadorias Vendidas - CMV. Caso o valor das vendas seja inferior ao CMV acrescido deste percentual de lucro, a legislação tributária estadual autoriza a fiscalização a lançar mão da presunção de que houve saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto, nos termos do que dispõem os artigos 3º, § 9º, da Lei nº 6.379/96; 643, § 4º, II e 646 do RICMS/PB[1], in verbis:
Lei nº 6.379/96:
Art. 3º O imposto incide sobre:
(...)
§ 8º O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa e bancos, suprimentos a caixa e bancos não comprovados ou a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou de prestações de serviços sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.
§ 9º A presunção de que cuida o § 8º, aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, assim como a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados ou Vendidos, conforme o caso.
RICMS/PB:
Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.
(...)
§ 3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, será exigido o livro Caixa, devidamente autenticado pela repartição fiscal do domicílio do contribuinte, com a escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês.
§ 4º Para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couber, os procedimentos abaixo, dentre outros, cujas repercussões são acolhidas por este Regulamento:
I - a elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como considerada a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;
II - o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.
(...)
Art. 646. Autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção:
I – o fato de a escrituração indicar:
a) insuficiência de caixa;
b) suprimentos a caixa ou a bancos, não comprovados;
II – a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes;
III – qualquer desembolso não registrado no Caixa;
IV – a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas;
V – declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito.
Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, bem como, a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados , quando da transferência ou venda, conforme o caso.
Por imperativo legal, a constatação desta omissão obriga o auditor fiscal a lançar, de ofício, o crédito tributário decorrente desta infração, tendo em vista a receita marginal originária das saídas omitidas afrontar o disciplinamento contido nos art. 158, I, e art. 160, I, ambos do RICMS/PB, os quais transcrevemos a seguir:
Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:
I - sempre que promoverem saída de mercadorias;
Art. 160. A nota fiscal será emitida:
I - antes de iniciada a saída das mercadorias;
Como forma de garantir efetividade ao comando insculpido nos dispositivos anteriormente reproduzidos, a Lei nº 6.379/96, em seu artigo 82, V, “a”, estabeleceu a penalidade aplicável àqueles que violarem as disposições neles contidas.
Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:
(...)
V - de 100% (cem por cento):
a) aos que deixarem de emitir nota fiscal pela entrada ou saída de mercadorias, de venda a consumidor ou de serviço, ou as emitirem sem observância dos requisitos legais;
A presunção de que trata o artigo 646 do RICMS/PB, contudo, é relativa, cabendo ao contribuinte a prova da sua improcedência, conforme prevê a parte final do caput do referido artigo.
Em razão de não haver sido apresentado recurso voluntário, o efeito devolutivo restringir-se-á à análise dos termos da decisão singular.
Primeiramente, devemos observar que, durante o período dos fatos geradores, a empresa estava enquadrada como Simples Nacional, conforme atesta o extrato da consulta ao Dossiê do Contribuinte do Sistema ATF da Secretaria de Estado da Fazenda da Paraíba:
Início |
Término |
Razão social |
Situação cadastral |
Natureza jurídica |
Tipo de estabelecimento |
Tipo de unidade |
Regime de apuração |
Município |
18/09/2012 |
02/04/2014 |
KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS |
ATIVO |
EMPRESÁRIO (INDIVIDUAL) |
MATRIZ |
UNIDADE PRODUTIVA |
SIMPLES NACIONAL |
SAO VICENTE DO SERIDO |
02/04/2014 |
01/01/2018 |
KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME |
ATIVO |
EMPRESÁRIO (INDIVIDUAL) |
MATRIZ |
UNIDADE PRODUTIVA |
SIMPLES NACIONAL |
SAO VICENTE DO SERIDO |
01/01/2018 |
04/01/2018 |
KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME |
ATIVO |
EMPRESÁRIO (INDIVIDUAL) |
MATRIZ |
UNIDADE PRODUTIVA |
NORMAL |
SAO VICENTE DO SERIDO |
04/01/2018 |
--- |
KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME |
SUSPENSO |
EMPRESÁRIO (INDIVIDUAL) |
MATRIZ |
UNIDADE PRODUTIVA |
NORMAL |
SAO VICENTE DO SERIDO |
Repiso que a acusação descrita no Auto de Infração teve, como fato motivador, a identificação de omissões de saídas de mercadorias tributáveis, detectadas pela fiscalização quando do levantamento das Contas Mercadorias relativas aos exercícios de 2013 e 2015.
Não podemos perder de vista que a LC nº 123/06, em seu artigo 34, não deixa dúvidas acerca da aplicação das presunções de omissão de receitas para contribuintes do Simples Nacional.
Art. 34. Aplicam-se à microempresa e à empresa de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional todas as presunções de omissão de receita existentes nas legislações de regência dos impostos e contribuições incluídos no Simples Nacional.
Pois bem. A Lei Complementar nº 123/06, em seu artigo 13, § 1º, “f”, determina que, nas operações ou prestações desacobertadas de documento fiscal (omissão de receitas), seja aplicada a legislação tributária atribuída às demais pessoas jurídicas. A clareza do texto normativo não exige do hermeneuta maiores esforços interpretativos. Senão vejamos:
Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:
(...)
§ 1o O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:
(...)
XIII - ICMS devido:
(...)
f) na operação ou prestação desacobertada de documento fiscal; (g. n.)
O comando insculpido no dispositivo acima transcrito não deixa dúvidas quanto à necessidade de deslocamento da sistemática de apuração do ICMS para o regime geral quando o contribuinte, enquadrado como Simples Nacional, realiza quaisquer das condutas descritas no inciso XIII do § 1º do artigo 13 da Lei Complementar nº 123/2006.
Não obstante o fato de restar demonstrada a possibilidade de se exigir, de contribuinte enquadrado como Simples Nacional, ICMS em razão de omissão de receitas, vislumbro, no caso em tela, uma questão de essencial relevância que prejudicou o lançamento em sua integralidade, a saber: a técnica aplicada.
Imperativo salientarmos mais uma vez que o que se está a discutir não é a omissão em si, mas a técnica da Conta Mercadorias para contribuinte do Simples Nacional, pelo fato de a LC nº 123/06 se mostrar incompatível com o procedimento realizado pela auditoria.
Em tempo: para os demais contribuintes, a técnica revela-se plenamente eficaz, apropriada e dotada de validade jurídica para embasar a acusação. O alcance deste entendimento é, portanto, hermético, não autorizando ampliações para situações outras.
Noutras palavras, o que se está a buscar é a compatibilização da legislação estadual com a Lei Complementar nº 123/06.
Assim como recorremos à lei especial para justificar a possibilidade de aplicação da legislação afeta às demais pessoas jurídicas para os casos de omissão de receitas, também o fazemos para sustentar a imprestabilidade da técnica utilizada (Conta Mercadorias) para dar arrimo à acusação em comento.
É cediço que a LC nº 123/06 instituiu tratamento diferenciado para os contribuintes que se amoldarem às condições nela estabelecidas e fizerem opção por este regime diferenciado. Neste norte, a partir da inclusão do contribuinte na sistemática do Simples Nacional, o regramento especial passa a produzir efeitos para o sujeito passivo, assim como para o Fisco. Não se quer dizer com isso que os demais normativos não lhe sejam aplicáveis. O que se afirma é que se deve observar se a norma se harmoniza com a LC nº 123/06.
Posto de outra forma - e já adentrando no caso concreto -, para que se possa validar o procedimento fiscal que resultou na identificação de omissão de receitas, faz-se mister analisarmos se os procedimentos da Conta Mercadorias são compatíveis com o regramento especial.
O RICMS/PB, em seu artigo 643, §§ 3º e § 4º, disciplina que, no exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couberem, os seguintes procedimentos:
a) Elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;
b) Levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.
Ao dispor acerca deste último procedimento, o RICMS/PB, ao estabelecer percentual (30%) a ser acrescido ao Custo de Mercadorias Vendidas, mostra-se claramente em dissonância com a sistemática estabelecida pela LC nº 123/06.
O contribuinte enquadrado como Simples Nacional recolhe o tributo devido sobre o seu faturamento, em observância ao que estabelece o artigo 18, § 3º, da LC nº 123/06:
Art. 18. O valor devido mensalmente pela microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional será determinado mediante aplicação das alíquotas efetivas, calculadas a partir das alíquotas nominais constantes das tabelas dos Anexos I a V desta Lei Complementar, sobre a base de cálculo de que trata o § 3o deste artigo, observado o disposto no § 15 do art. 3º.
(...)
§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota determinada na forma do caput e dos §§ 1º e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário.
§ 3º Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota efetiva determinada na forma do caput e dos §§ 1º, 1º-A e 2º deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário. (Redação dada pela Lei Complementar nº 155, de 2016)
Assim, o contribuinte que apura e recolhe o tributo com base nos dispositivos acima reproduzidos, estará em situação regular quanto à obrigação principal, à luz da LC nº 123/06.
A cobrança de tributos, por força do que estabelece o artigo 3º do Código Tributário Nacional, é uma atividade administrativa vinculada, não sendo possível ao auditor fiscal agir de forma discricionária.
Esta ressalva se faz necessária para explicar que, no caso em comento, não estamos afastando a aplicabilidade do artigo 643, § 4º, do RICMS/PB, tampouco deixando ao talante da autoridade fiscal a possibilidade de “escolher” quando utilizá-la. Uma análise mais atenta do dispositivo citado nos permite concluir que a solução para a questão se extrai do § 4º do referido artigo. Vejamos:
Art. 643. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício.
(...)
§ 3º No exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, será exigido o livro Caixa, devidamente autenticado pela repartição fiscal do domicílio do contribuinte, com a escrituração analítica dos recebimentos e pagamentos ocorridos em cada mês.
§ 4º Para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couber, os procedimentos abaixo, dentre outros, cujas repercussões são acolhidas por este Regulamento:
I - a elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como considerada a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;
II - o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24. (g. n.)
Partindo do princípio de que a lei não contém palavras inúteis, a expressão “onde couber” indica que os procedimentos previstos nos incisos I e II do § 4º do artigo 643 do RICMS/PB não são obrigatórios para todo e qualquer exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular.
Este comando, portanto, não é taxativo e não vincula o auditor fiscal a adotá-los em todas as situações, mas somente nos casos em que “couberem”.
O contribuinte enquadrado como Simples Nacional, como já demonstrado, possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.
Na LC nº 123/06, não há qualquer exigência neste sentido para fins de tributação. Apenas no inciso X do seu artigo 29 consta uma referência ao lucro bruto – ainda que de forma indireta -, contudo para efeito de exclusão do regime.
Art. 29. A exclusão de ofício das empresas optantes pelo Simples Nacional dar-se-á quando:
(...)
X – for constatado que durante o ano-calendário o valor das aquisições de mercadorias para comercialização ou industrialização, ressalvadas hipóteses justificadas de aumento de estoque, for superior a 80% (oitenta por cento) dos ingressos de recursos no mesmo período, excluído o ano de início de atividade;
Somente depois de excluído do Simples Nacional, o Fisco está autorizado a lançar mão da Conta Mercadorias – Lucro Presumido para aqueles que não detenham escrita contábil, o que não implica dizer que o contribuinte, enquanto enquadrado na sistemática da LC nº 123/06, esteja “blindado”. A fiscalização tem o poder-dever de verificar a regularidade das operações do contribuinte, utilizando-se, para tanto, dos demais recursos de que dispõe para cumprir o seu mister.
Este entendimento, registre-se, encontra eco em diversas decisões proferidas pelo Conselho de Recursos Fiscais.
Diante de todo o exposto e em observância à jurisprudência desta Corte, reformo, de ofício, a decisão singular e declaro improcedente a acusação de omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Conta Mercadorias.
0021 – OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – LEVANTAMENTO FINANCEIRO ( EXERCÍCIO DE 2014)
A acusação ora em comento originou-se a partir da técnica de fiscalização denominada LEVANTAMENTO FINANCEIRO, cujo mecanismo de aferição proporciona analisar se houve equilíbrio entre os somatórios dos desembolsos e o total das receitas auferidas no mesmo exercício, repercutindo em omissão de vendas sempre que as despesas superarem as receitas. Nesta hipótese, a legislação vigente autoriza a fiscalização a se valer da presunção juris tantum de omissão de saídas de mercadorias tributáveis, arrimado no parágrafo único do art. 646 do RICMS/PB, já reproduzido anteriormente.
Nesta esteira, considerando haver o contribuinte infringido a legislação tributária no exercício de 2014, o auditor fiscal responsável pela lavratura do Auto de Infração em tela, propôs, como medida punitiva, a aplicação da multa insculpida no artigo 82, V, “f”, da Lei nº 6.379/96, in verbis:
Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:
(...)
V - de 100% (cem por cento):
(...)
f) aos que deixarem de recolher o imposto proveniente de saída de mercadoria, dissimulada por receita de origem não comprovada, inclusive a representada por despesa realizada a descoberto de caixa, pela existência de passivo fictício ou por qualquer forma apurada através de levantamento da escrita contábil;
O nobre julgador singular, ao se debruçar sobre o caderno processual, identificou que, na Conta Mercadorias do exercício de 2014 (fls. 10), fora apurado um prejuízo bruto relativo às operações com mercadorias com substituição tributária, isentas e/ou não tributadas no valor de R$ 296.152,75 (duzentos e noventa e seis mil, cento e cinquenta e dois reais e setenta e cinco centavos).
Ao se defrontar com esta situação, com o objetivo de corrigir possíveis superavaliações dos créditos tributários identificados nos Levantamentos Financeiros, o diligente julgador fiscal procedeu aos ajustes necessários, expurgando, do montante tributável do exercício de 2014, a correspondente parcela do prejuízo bruto da Conta Mercadorias referente aos produtos com substituição tributária, isentos e não tributados.
Esta conduta vem sendo observada pelas instâncias administrativas de julgamento da Secretaria de Estado da Fazenda da Paraíba como forma de se evitar o bis in idem, a exemplo da decisão proferida por meio do Acórdão nº 481/2017 da relatoria do Cons.º João Lincoln Diniz Borges, cuja ementa reproduzimos a seguir:
OMISSÃO DE VENDAS. LEVANTAMENTO FINANCEIRO. PROVAS DOCUMENTAIS DA EXSTÊNCIA DE SALDOS BANCÁRIOS E DE DUPLICATAS A PAGAR. AJUSTES REALIZADOS. EXPURGO DE OPERAÇÕES SUJEITAS À SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA, ISENTA E/OU NÃO TRIBUTADA. FALTA DE REPERCUSSÃO TRIBUTÁRIA AUTO DE INFRAÇÃO IMPROCEDENTE. REFORMADA A DECISÃO SINGULAR. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO E VOLUNTÁRIO PROVIDO.
Diferença tributável apurada por meio do Levantamento Financeiro caracteriza a presunção legal de que houve omissões de saídas de mercadorias tributáveis, sem o pagamento do imposto devido. In casu, a apresentação de provas documentais acerca da existência de saldos bancários e de duplicatas a pagar, não consideradas no procedimento inicial, além da constatação de prejuízo bruto com mercadorias sujeitas à substituição tributária e/ou não tributadas apurado em levantamento da Conta Mercadorias, fizeram derrocar a exigência fiscal apoiada na presunção esculpida no ordenamento tributário.
Tendo em vista que o valor a ser deduzido (R$ 296.152,75) é superior à diferença tributável registrada no Levantamento Financeiro (R$ 206.235,19), a repercussão tributária não mais se evidencia para o exercício de 2014.
Sendo assim, sem mais a acrescentar, ratifico os termos da decisão recorrida quanto à acusação de omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Levantamento Financeiro.
É imprescindível atentarmos que, aos contribuintes que não mais se encontrem com inscrição estadual ativa, a Lei nº 10.094/13, em seu artigo 11, § 10, atribui ao sócio administrador da empresa ou ao representante legal constante no Cadastro de Contribuintes do ICMS a prerrogativa de indicar endereço no Processo Administrativo Tributário para intimação dos atos referentes ao processo do qual seja parte.
Art. 11. Far-se-á a intimação:
(...)
II - por via postal, com Aviso de Recebimento (AR), encaminhado ao domicílio tributário do sujeito passivo, observados os §§ 2º, 9º e 10 deste artigo;
(...)
§ 9º Para efeitos do disposto no inciso II do “caput” deste artigo, a intimação, quando o sujeito passivo não estiver com sua inscrição ativa perante o Cadastro de Contribuintes do ICMS do Estado, deverá ser realizada:
I - no endereço do sócio administrador da empresa;
II - no endereço do representante legal constante no Cadastro de Contribuintes do ICMS, caso a pessoa jurídica não tenha sócio administrador;
III - por edital, publicado no Diário Oficial Eletrônico - DOe-SER, no caso de devolução do Aviso de Recebimento (AR) sem lograr êxito na entrega da intimação, nos termos dos incisos I e II deste parágrafo.
Acrescido o § 10 ao art. 11 pela alínea “a” do inciso II do art. 5º da Lei nº 11.247/18 - DOE de 14.12.18. OBS: efeitos a partir de 1º de janeiro de 2019.
§ 10. Para efeitos do § 9º e em caso de endereço desatualizado no CCICMS/PB, fica facultado ao sócio administrador da empresa ou ao representante legal constante no Cadastro de Contribuintes do ICMS indicar endereço no Processo Administrativo Tributário para intimação dos atos referentes a este Processo. (g. n.)
Atendidas as condições estabelecidas nos §§ 9º e 10 do artigo 11 da Lei nº 10.094/13, é inegável que assiste ao contribuinte o direito de indicar endereço para recebimento de intimações/notificações relativas ao Processo nº 0140692017-7.
Registre-se que a solicitação fora expressamente formulada na impugnação (fls. 24).
Com estes fundamentos,
VOTO pelo recebimento do recurso de ofício, por regular, e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento. Contudo, em observância à jurisprudência desta Corte, reformo, de ofício, a decisão singular para julgar improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000134/2017-14, lavrado em 26 de janeiro de 2017 contra a empresa KLEYTON CORDEIRO DE FARIAS ME, eximindo-a de quaisquer ônus decorrentes do presente processo.
Intimações a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar, as quais também devem ser remetidas para o seguinte endereço: Rua Senador Rui Carneiro, nº 301, São Vicente do Seridó - PB, conforme requerido às fls. 24.
Os Textos disponibilizados na Internet não substituem os publicados oficialmente, por determinação legal.