ACÓRDÃO Nº 000479/2020 PROCESSO N° 1892992014-4
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
PROCESSO N° 1892992014-4
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
Recorrente:BOMPREÇO SUPERMERCADOS DO NORDESTE LTDA.
Recorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTOS PROCESSOS FISCAIS - GEJUP
Advogado:ALEXANDRE DE ARAÚJO ALBUQUERQUE – OAB/PE Nº 25.108
Preparadora: CENTRO DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO - GR1 SEFAZ – J. PESSOA
Autuantes: MARCELO CRUZ DE LIRA E MÔNICA GONÇALVES SOUZA MIGUEL
Relatora:CONSª. MAIRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES.
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS. APROVEITAMENTO DE CRÉDITOS DE ICMS DA AQUISIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA EM ATIVIDADE DE PANIFICAÇÃO. SUPERMERCADO. EXCLUSÃO DA ATIVIDADE PELO DECRETO 7.212/2010. APLICABILIDADE DO CONCEITO DE INDUSTRIALIZAÇÃO CONSTANTE NO REGULAMENTO DO IPI. PRECEDENTES DO STJ EM JULGAMENTO DE RECURSO REPETITIVO. OCORRÊNCIA DE INFRAÇÃO – INDICAR COMO ISENTAS DE ICMS OPERAÇÕES TRIBUTADAS PELO IMPOSTO ESTADUAL – OCORRÊNCIA DE INFRAÇÃO. EXCLUSÃO DE ITENS DE CONSUMO DO ESTABELECIMENTO – VENDAS SEM EMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO FISCAL. OCORRÊNCIA DA INFRAÇÃO. ALTERADA DE OFÍCIO A DECISAO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. RECURSO VOLUNTARIO PARCIALMENTE PROVIDO.
O creditamento irregular de ICMS da aquisição de energia elétrica configura infração ao art. 72, §1º, II do RICMS/PB. Atividades de panificação e congelamento de alimentos que não estão incluídas no conceito de industrialização, conforme prevê o art. 5º, I, “a” do Decreto 7.212/2010 (Regulamento do IPI). Precedentes do STJ em julgamento de Recurso Repetitivo (tema repetitivo 242).
Configura infração à norma tributária a falta de recolhimento do ICMS nos documentos fiscais emitidos indicando-se como isentas operações sujeitas ao imposto estadual, o que também ocorre na venda de mercadorias sem emissão da correspondente documentação fiscal.
O pagamento voluntário de parte dos valores apurados, relativos às operações com produtos de informática, com mercadorias isentas e/ou sujeitas ao regime de substituição tributária, é causa de extinção do respectivo crédito tributário.
Necessária a exclusão, no Levantamento Quantitativo, de itens de consumo próprio do estabelecimento do contribuinte quanto à acusação de vendas sem emissão de documentação fiscal.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da Primeira Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o VOTO pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e, quanto ao mérito, pelo seu provimento parcial, para reformar a sentença monocrática e julgar parcialmente procedente, o Auto de Infração de Estabelecimento de nº 93300008.09.00002508/2014-93, lavrado em 20/02/2019, em face de BOMPREÇO SUPERMERCADOS DO NORDESTE LTDA., inscrição estadual nº 16.160.755-1, já qualificada nos autos, declarando devido o crédito tributário no valor de R$ 1.144.545,8 (um milhão, cento e quarenta e quatro mil, quinhentos e quarenta e cinco reais e oitenta centavos), sendo R$ 592.136,25 (quinhentos e noventa e dois mil, cento e trinta e seis reais e vinte e cinco centavos), referentes ao ICMS devido, mais R$ 552.409,55 (quinhentos e cinquenta e dois mil, quatrocentos e nove reais e cinquenta e cinco centavos), de multa por infração, cuja previsão legal está disposta no artigo 82, incisos IV e V, alíneas “a” e “h”, todos da Lei 6.379/96
Cancelo, pelos motivos expostos, o crédito tributário no valor de R$ 52.275,16 (cinquenta e dois mil, duzentos e setenta e cinco reais e dezesseis centavos), sendo R$ 29.871,52 (vinte e nove mil, oitocentos e setenta e um reais e cinquenta e dois centavos) de ICMS e R$ 22.403,64 (vinte e dois mil, quatrocentos e três reais e sessenta e quatro centavos) de multa por infração.
Frise-se, oportunamente, que o contribuinte realizou o recolhimento de ICMS de parte dos lançamentos realizados pela fiscalização, conforme comprovantes anexos às fls. 86/146 e consulta ao Sistema ATF, valor que deverá ser excluído do crédito tributário devido.
P.R.I
Primeira Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 30 de novembro de 2020.
MAÍRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES
Conselheira Relatora
LEONILSON LINS DE LUCENA
Presidente
Participaram do presente julgamento os membros da Primeira Câmara de Julgamento, PETRÔNIO RODRIGUES LIMA, THAÍS GUIMARÃES TEIXEIRA FONSECA E LEONARDO DO EGITO PESSOA.
SÉRGIO ROBERTO FÉLIX LIMA
Assessor Jurídico
Relatório
Em exame, o Recurso Voluntário interposto por BOMPREÇO SUPERMERCADOS DO NORDESTE LTDA. em face da decisão monocrática que julgou procedente o Auto de Infração de Estabelecimento de nº 93300008.09.00002508/2014-93, lavrado em 20/02/2019, do qual constam as seguintes imputações:
1. “FALTA DE RECOLHIMENTO DO IMPOSTO ESTADUAL – Falta de recolhimento do imposto estadual.”
“NOTA EXPLICATIVA – TAL IRREGULARIDADE EVIDENCIOU-SE PELO FATO DE O CONTRIBUINTE EM DESACORDO COM A LEGISLAÇÃO TRIBUTARIA PERTINENTE UTILIZOUSE INDEVIDAMENTE DE CREDITOS FISCAIS NAS SITUAÇOES ABAIXO:
ATIVO FIXO FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS, EM VIRTUDE DE O CONTRIBUINTE TER APROVEITADO O CRÉDITO FISCAL, CONCERNENTE À AQUISIÇÃO DE ATIVO FIXO, EM MONTANTE SUPERIOR AO DEVIDO, TENDO EM VISTA A INOBSERVÂNCIA DA CORRETA FORMA PARA A APURAÇÃO DO IMPOSTO EM CADA PERÍODO.
ART. 78, I, II E III, DO RICMS/PB, APROV. PELO DEC. 18.930/97 ART. 82, V, "H", DA LEI N.6.379/96 100,00 %
ENERGIA ELÉTRICA: CONTRARIANDO DISPOSITIVOS LEGAIS, O CONTRIBUINTE SE CREDITOU DO ICMS DESTACADO EM DOCUMENTO(S) FISCAL(IS), RELATIVO(S) À ENTRADA DE ENERGIA ELÉTRICA CONSUMIDA PELO ESTABELECIMENTO, EM HIPÓTESE NÃO PREVISTA NA LEGISLAÇÃO FISCAL, RESULTANDO NA FALTA DE RECOLHIMENTO DO IMPOSTO ESTADUAL.
ART. 72, §1º, II, DO RICMS/PB, APROV.P/DEC. N.18.930/97 ART. 82, V, "H", DA LEI N.6.379/96 100,00 %
OPERAÇÃO SUJEITA AO REGIME DE SUBSTITUIÇÃO TRIBUTARIA: FALTA DE RECOLHIMENTO DO IMPOSTO ESTADUAL, TENDO EM VISTA O CONTRIBUINTE TER APROVEITADO INDEVIDAMENTE COMO CRÉDITO FISCAL, O ICMS NORMAL DESTACADO EM DOCUMENTO(S) FISCAL(IS), ORIUNDA DE OPERAÇÃO SUJEITA AO REGIME DE SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA, CUJA FASE DE TRIBUTAÇÃO JÁ ESTAVA ENCERRADA.
ART. 391, §6º, DO RICMS/PB, APROV. PELO DEC. 18.930/97 ART. 82, V, "H", DA LEI N.6.379/96 100,00 %
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS, EM VIRTUDE DE O CONTRIBUINTE TER APROVEITADO CRÉDITOS FISCAIS ORIUNDOS DE OPERAÇÕES NÃO TRIBUTADAS PELO IMPOSTO ESTADUAL. ART. 82, I, DO RICMS, APROVADO PELO DEC. N 18.930/97 - ART. 82, V, "H", DA LEI N. 6.379/96 : 100% SEGUEM PLANILHAS EXPLICATIVAS EM MIDIA DIGITAL QUE SÃO PARTES INTEGRANTES DESTE AUTO DE INFRAÇÃO”
2. “INDICAR COMO ISENTAS DO ICMS, OPERAÇÕES /MERCADORIAS OU PRESTAÇÃOES DE SERVIÇOS SUJEITAS AO IMPOSTO ESTADUAL. >> Falta de recolhimento do imposto estadual, face à ausência de débito do ICMS nos livros próprios, em virtude de ter indicado nos documentos fiscais operações com mercadorias tributáveis ou prestações de serviços, como sendo isentas de ICMS.”
“NOTA EXPLICATIVA – INDICAR NAS VENDAS COMO ISENTAS AS MERCADORIAS SUJEITAS A TRIBUTAÇÃO.SEGUEM PLANILHAS EXPLICATIVAS EM MIDIA DIGITAL QUE SÃO PARTES INTEGRANTES DESTE AUTO DE INFRAÇÃO”
3. “VENDAS SEM EMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO FISCAL >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte vendeu mercadorias sem a emissão de documentação fiscal, culminando na falta de recolhimento do imposto”
NOTA EXPLICATIVA – FOI REALIZADO O LEVANTAMENTO QUANTITATIVO DE MERCADORIAS - PERÍODO DE 2010- ONDE FOI DETECTADO VENDA DE MERCADORIAS TRIBUTAVEIS SEM A EMISSAO DE DOCUMENTO FISCAL.SEGUEM PLANILHAS EXPLICATIVAS EM MIDIA DIGITAL QUE SÃO PARTES INTEGRANTES DESTE AUTO DE INFRAÇÃO”
Foram dados como infringidos o art. 106, além dos arts. 106, c/c, Art. 52, Art. 54, e §2º, I e II, e arts. 2º e 3º e art. 60, I, "b" e III, "d" e, I, e arts. 158, I, e 160, I, todos do RICMS/PB, aprov. p/Dec.18.930/97. O crédito tributário proposto foi de R$ 1.196.820,96 (um milhão, cento e noventa e seis mil, oitocentos e vinte reais e noventa e seis centavos), sendo R$ 622.007,77 (seiscentos e vinte e dois mil e sete reais e setenta e sete centavos), referentes ao ICMS devido, mais R$ 574.813,19 (quinhentos e setenta e quatro mil, oitocentos e treze reais e dezenove centavos), de multa por infração, cuja previsão legal está disposta no artigo 82, incicos IV e V, alíneas “a” e “h”, todos da Lei 6.379/96.
Regularmente cientificada do auto de Infração, na forma pessoal, em 29/12/2014 (fl. 8), a empresa autuada apresentou impugnação, em 15/01/2015 (fl. 20-51), na qual se insurge contra os termos da autuação com base nas seguintes argumentações:
- que a autuação é nula por preterição do direito de defesa e falta de comprovação das infrações e de indicação do dispositivo legal infringido;
- que é nulo por ocorrência de vícios, já que não foi demonstrada a real ocorrência da infração de indicar como isentas do ICMS operações com mercadorias sujeitas à incidência do tributo, em função, também, de que indicar apenas do número da nota fiscal e o valor do ICMS supostamente devido não são suficientes para conferir certeza e liquidez do crédito tributário, com plena ocorrência do cerceamento do direito de defesa;
- que é legítimo o crédito de ICMS referente à industrialização de produtos objetos de comercialização posterior, a exemplo da padaria, conforme atesta laudo técnico;
- que, para a acusação de omissão de saídas, apurada a partir do levantamento quantitativo, a fiscalização deixou de considerar a totalidade das operações de saídas realizadas pela autuada durante os exercícios fiscalizados, afirmando existirem inconsistências nos dados levantados na auditoria;
- que a fiscalização deixou de considerar a existência de compras em atacado e cuja revenda foi realizada em unidade, já que um mesmo produto é movimentado em diversos códigos, as perdas normais no processo de comercialização, armazenagem, expedição, que ocorrem no setor varejista de supermercados, conforme relatório da ABRAS;
- que há necessidade de perícia técnica;
- que a multa aplicada tem caráter confiscatório, se reportando ao artigo 112, do CTN, para o caso de dúvida, seja aplicada a legislação mais favorável ao contribuinte;
Assim, pede que seja dado provimento à impugnação, para que seja decretada a nulidade/improcedência do auto de infração e, no caso de não acolhimento dos pedidos, que seja reduzida ou mesmo afastada a multa aplicada, em observância ao princípio da razoabilidade, proporcionalidade e do não confisco.
Com anotação de ocorrência de antecedentes fiscais que não ensejam reincidência (fl. 79), os autos foram remetidos à GEJUP, com distribuição ao Julgador Lindemberg Roberto de Lima, que exarou sentença considerando o auto de infração PROCEDENTE, conforme ementa abaixo:
PRELIMINAR. NILIDADE. REJEITADA.FALTA DE RECOLHIMENTO DO IMPOSTO ESTADUAL.CRÉDITO INDEVIDO. AQUISIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. UTILIZAÇÃO NA PADARIA E NO SUPERMERCADO. ENTRADAS DE ATIVO IMOBILIZADO. CREDITAMENTO MAIOR QUE O DEVIDO.OBSERVÂNCIA DA PROPORCIONALIDADE.ENTRADAS DE PRODUTOS DE INFORMÁTICA SEM OBSERVÂNCIA DA REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO. OPERAÇÃO SUJEITA À SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA COM APROVEITAMENTO DO ICMS NORMAL DESTACADO NO DOCUMENTO FISCAL. OPERAÇÕES NÃO TRIBUTADAS PELO ICMS. INDICAR COMO NÃO TRIBUTADAS PELO ICMS OPERAÇÕES C/ MERCADORIAS OU PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS SUJEITAS AO IMPOSTO ESTADUAL. LEVANTAMENTO QUANTITATIVO DE MERCADORIAS. VENDAS SEM EMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO FISCAL. DENÚNCIAS COMPROVADAS. EXTINÇÃO DE PARTE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO PELO PAGAMENTO.
- Os fatos descritos no auto de infração têm como suporte as informações dos ECFs e Escrituração Fiscal Digital da própria Impugnante, a quem competia retificá-las espontaneamente, no caso de alguma desconformidade, o que não se vislumbra nos autos. A impugnante não fez a identificação da mercadoria que considerou isenta, que ensejou na exigência do imposto devido e não recolhido. Portanto, diante do suporte probatório, não tem lugar a nulidade dos respectivos lançamentos de ofício. Rejeita-se, pois, a preliminar de cerceamento do direito de defesa, suscitada a esse fundamento de fato.
- O aproveitamento de créditos fiscais sem observância dos parâmetros da legislação de regência configura infração, diante da consequente falta de recolhimento do imposto estadual correspondente. In casu, restou comprovado o creditamento irregular do ICMS na aquisição de energia elétrica destinada às atividades de panificação e de congelamento de produtos perecíveis, exercidas em estabelecimento supermercadista, visto não se configurarem atividades de industrialização, bem como é irregular o aproveitamento de créditos fiscais referentes a ativo fixo sem observância da proporcionalidade estatuída na forma da legislação do ICMS, e, ainda, os créditos de ICMS destacados em documento fiscal de operação com produtos de informática e automação em valor maior que o permitido pela legislação de regência; os créditos de ICMS Normal destacado em documento fiscal oriundo de operação sujeita à Substituição Tributária, na qual ocorre o encerramento da fase de tributação; e, por fim, o creditamento de ICMS originário de operações não tributadas pelo imposto.
- Comprovada a denúncia de falta de recolhimento do imposto estadual em face da ausência de débito do imposto nos livros próprios, em virtude de o contribuinte ter indicado nos ECFs/EFDs operações com mercadorias tributáveis como sendo não tributada pelo ICMS.
- Verificado em Levantamento Quantitativo de Mercadorias diferenças tributáveis permite a identificação de vendas sem emissão de documentação fiscal, obrigando o lançamento de ofício do imposto e multas devidos.
- Regularidade na aplicação da penalidade e inocorrência de situação prevista em lei para ser aplicado o benefício da dúvida na forma prevista pelo art. 112 do CTN.
- Constatação da extinção de parte crédito tributário devidamente lançado pelo pagamento, a teor do art. 156, I do CTN, sendo considerada matéria não contenciosa nos autos, conforme art. 51 da Lei no 10.094/13.
AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE.
Cientificado da decisão de primeira instância administrativa através de Aviso de Recebimento (fl. 170), em 29/03/2019, o autuado apresentou recurso voluntário (fls. 174/237) ao Conselho de Recursos Fiscais, em 30/04/2019, guerreando os termos da sentença monocrática com base nos seguintes argumentos:
- que o conceito de atividade industrial do Decreto nº 7.212/2010 (Regulamento do IPI) não se amolda adequado na análise da apropriação de créditos fiscais de ICMS de energia elétrica;
- que os créditos fiscais referentes a energia elétrica são possíveis de apropriação porque a recorrente industrializa produtos de padaria, além da seção de frios, mesmo porque a legislação não faz distinção entre as diferentes naturezas dos estabelecimentos, exigindo apenas que a energia seja consumida no processo industrial;
- que não houve comprovação da infração, quanto à acusação de indicar como isentas mercadorias tributadas com o imposto, por não ter indicado a mercadoria e o embasamento legal para sua tributação;
- que as mercadorias são adquiridas em atacado e a revenda ocorre em diferentes unidades ou a retalho (quilo, garrafa, lata, etc), além de considerar quantidades inverossímeis a título de estoque, o que termina contaminando a qualidade da fiscalização no que tange ao levantamento quantitativo de mercadorias;
- que, no levantamento quantitativo de mercadorias, a fiscalização inclui produtos que não são da mercancia natural do recorrente, a exemplo de “pallets”;
- que a fiscalização deixou de considerar as perdas normais do exercício da atividade do recorrente;
- que a multa aplicada é desarrazoada, seja pela ausência de comprovação da infração, seja pela exorbitância da penalidade aplicada em desapreço ao princípio do não-confisco;
- que, na dúvida a respeito da interpretação da norma jurídica, se aplique aquela mais favorável ao contribuinte.
- Por fim, requer o reconhecimento e declaração/decretação da nulidade e/ou improcedência integral da exigência fiscal, sucessivamente reduzida ou afastada a multa aplicada, a interpretação mais favorável ao contribuinte a respeito da legislação tributária e a produção, por todos os meios admitidos em direito, de provas, inclusive perícia técnica.
Por fim, os autos foram encaminhados para este Conselho de Recursos Fiscais, com distribuição a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, com o recurso voluntário que será objeto de apreciação e julgamento.
Este é o relatório.
VOTO |
Em exame, o recurso voluntário, interposto contra decisão de primeira instância que julgou procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00002508/2014-93, lavrado em 20/02/2019, contra a empresa em epígrafe, com exigência do crédito tributário em referência.
Insta declarar que a peça recursal apresentada atendeu ao pressuposto extrínseco da tempestividade, previsto no art. 77 da Lei nº 10.094/13.
Ressalte-se, liminarmente, que na peça acusatória estão delineadas as formalidades prescritas no art. 142 do CTN e nos dispositivos constantes nos arts. 14, 16 e 17, a Lei estadual, nº 10.094/2013 (Lei do PAT), abaixo transcritos:
CTN:
Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Lei nº 10.094/2013:
Art. 14. São nulos:
I - os atos e termos lavrados por pessoa incompetente;
II - os despachos e decisões proferidas por autoridade incompetente;
III - os lançamentos cujos elementos sejam insuficientes para determinar a matéria objeto da exigência tributária e o respectivo sujeito passivo, ressalvada, quanto à identificação deste, a hipótese de bens considerados abandonados;
IV - os despachos e as intimações que não contenham os elementos essenciais ao cumprimento de suas finalidades;
V - os autos de infração de estabelecimentos lavrados pelos auditores fiscais tributários estaduais de mercadorias em trânsito.
Art. 16. Os lançamentos que contiverem vício de forma devem ser considerados nulos, de ofício, pelos Órgãos Julgadores, observado o disposto no art. 15 desta Lei.
Art. 17. Está incluído na hipótese prevista no art. 16 desta Lei, o Auto de Infração lavrado em desacordo com os requisitos obrigatórios estabelecidos no art. 142 do Código Tributário Nacional, quanto:
I - à identificação do sujeito passivo;
II - à descrição dos fatos;
III - à norma legal infringida;
IV - ao nome, ao cargo, ao número de matrícula e à assinatura do autor do feito;
V - ao local, à data e à hora da lavratura;
VI - à intimação para o sujeito passivo pagar, à vista ou parceladamente, ou impugnar a exigência, no prazo de 30 (trinta) dias, contado a partir da data da ciência do lançamento.
Observa-se, ainda, que os fatos levantados pela auditoria estão baseados nas informações prestadas pelo próprio contribuinte através da sua Escrituração Fiscal Digital – EFD. Dessa forma, não há como acatar as alegações da recorrente sobre a necessidade de realização de perícia para validar a liquidez e certeza do crédito tributário apurado pela fiscalização, tendo em vista que os pontos contestados pela autuada estão claramente dispostos nos autos, sendo suficientes para a elucidação da controvérsia.
Assim, configura-se acertada a decisão do julgador singular em indeferir o pedido da recorrente para produção de provas, em razão de sua irrelevância para o resultado pretendido, salientando que, caso a autuada fosse detentora de alguma prova da improcedência das acusações, poderia tê-la juntado ao processo, antes da apreciação do recurso voluntário.
Quanto ao item “Seção de Preço”, levado a efeito em uma parte da planilha, a qual correspondente ao procedimento de apuração da falta que dá suporte à acusação de vendas de mercadorias tributáveis como se fossem isentas, entendo que a providência da Fiscalização, relativamente ao item acima citado, não tem o efeito de infligir ao lançamento de ofício efetuado com base nessa técnica de auditoria fiscal qualquer mácula capaz de atrair nulidade ao feito fiscal. Entretanto, é imprescindível a análise do fato por ocasião do deslinde das questões do mérito da causa, o que será realizado mais à frente.
NO MÉRITO
CRÉDITOS FISCAIS DE ENERGIA ELETRICA
No tocante aos créditos de energia elétrica, a fiscalização autuou o contribuinte pelo aproveitamento indevido dos créditos fiscais, advindos das aquisições de energia elétrica, conforme demonstrativo (fl. 14).
Neste sentido, constata-se, pelos “lançamentos” efetuados nos livros de Registro de Entradas e Apuração do ICMS, que a empresa compensou créditos do ICMS decorrentes das aquisições de energia elétrica para o consumo da empresa.
A recorrente argumenta que a energia elétrica se trata de insumo consumido nos setores produtivos da empresa (padaria e congelados), se manifestando pela legitimidade do aproveitamento desses créditos, citando dispositivos da legislação em vigor.
A legislação do ICMS, tomando como base a não cumulatividade do ICMS, prevê a compensação do imposto devido em cada operação com os valores recolhidos nas operações anteriores, conforme disciplinam os artigos 52 e 72 do RICMS/PB:
Art. 52. O imposto é não-cumulativo, compensando-se o que seja devido em cada operação ou prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação com o anteriormente cobrado por este Estado ou por outra unidade da Federação, relativamente à mercadoria entrada ou à prestação de serviço recebida, acompanhada de documento fiscal hábil, emitido por contribuinte em situação regular perante e Fisco.
Art. 72. Para fins de compensação do imposto devido, constitui crédito fiscal o valor do imposto relativo:
I - à entrada de mercadorias, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo fixo, ou ao recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação, observado o disposto no § 1º deste artigo e § 4º do art. 85;
(…)
§ 1º Na utilização dos créditos de que trata esta Seção, observar-se-á o seguinte (Lei nº 7.334/03):
I - somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento, nele entradas a partir de 1o de janeiro de 2020;
II – somente dará direito a crédito a entrada de energia elétrica no estabelecimento:
a) quando for objeto de operação de saída de energia elétrica;
b) quando consumida no processo de industrialização;
c) quando seu consumo resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção destas sobre as saídas ou prestações totais, (g.n.);
Como se observa, a legislação concede o direito ao aproveitamento dos créditos fiscais advindos das aquisições de energia elétrica quando utilizada no processo de industrialização da empresa.
Assim, valendo-se de laudo técnico fornecido pela empresa EMS PLANEJAMENTO EMPRESARIAL LTDA., apresentado em mídia digital (fls. 81), onde constam os percentuais de consumo de energia elétrica nos diversos setores da empresa, a recorrente espera obter tratamento igualitário ao da atividade industrial que permite o aproveitamento dos créditos advindos de aquisição de energia elétrica, quando utilizados no processo industrial[1].
Quanto à matéria, este Colegiado sedimentou o entendimento de ser inadequada a classificação da atividade de conservação de alimentos feitos em câmaras frigoríficas e similares, como um processo industrial, pois aí não se verifica qualquer transformação.
Ainda, no tratamento de casos análogos, o CRF/PB tem-se utilizado do conceito de atividade industrial trazido no art. 4º, do Decreto nº 7.212/2010, que trata do IPI, considerando ser esta a melhor acepção para o termo. Vejamos:
Art. 4º Caracteriza industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para consumo, tal como (Lei no 5.172, de 1966, art. 46, parágrafo único, e Lei no 4.502, de 1964, art. 3o, parágrafo único):
I - a que, exercida sobre matérias-primas ou produtos intermediários, importe na obtenção de espécie nova (transformação);
II - a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto (beneficiamento);
III - a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal (montagem);
IV - a que importe em alterar a apresentação do produto, pela colocação da embalagem, ainda que em substituição da original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria (acondicionamento ou reacondicionamento); ou
V - a que, exercida sobre produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização (renovação ou recondicionamento).
Ainda, o Regulamento do IPI, em seu art. 5º, apresenta as exclusões ao que se entende por industrialização, in verbis:
Exclusões
Art. 5 o Não se considera industrialização:
I - o preparo de produtos alimentares, não acondicionados em embalagem de apresentação:
a) na residência do preparador ou em restaurantes, bares, sorveterias, confeitarias, padarias, quitandas e semelhantes, desde que os produtos se destinem a venda direta a consumidor; (...)
No mesmo sentido, em recentes decisões, o STJ tem adotado o mesmo entendimento, considerando que as atividades de panificação e de congelamento de produtos perecíveis em supermercados não configuram atividades de industrialização. A matéria foi apreciada quando do julgamento do REsp nº 1.117.139 – RJ (2009/0099551-5), cuja ementa segue abaixo:
STJ – PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. ICMS. CREDITAMENTO (PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE). AQUISIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA CONSUMIDA NO ESTABELECIMENTO COMERCIAL (SUPERMERCADO). ATIVIDADES DE PANIFICAÇÃO E CONGELAMENTO DE ALIMENTOS. ARTIGO 33, II, B, DA LEI COMPLEMENTAR 87/96. ARTIGO 46, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CTN. DECRETO 4.544/2002 (REGULAMENTO DO IPI). PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. CREDITAMENTO DO ICMS. IMPOSSIBILIDADE.[2]
No voto, assim se expressou o eminente Relator:
“As atividades de panificação e de congelamento de produtos perecíveis por supermercado não configuram processo de industrialização de alimentos, por força das normas previstas no Regulamento do IPI (Decreto 4.544/2002), razão pela qual inexiste direito ao creditamento do ICMS pago na entrada da energia elétrica consumida no estabelecimento comercial”.
Nessa mesma linha, trilhou a Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia, ao responder questionamento de contribuinte, de onde destaco o seguinte trecho: “Assim sendo, e considerando que a legislação do ICMS adota a mesma definição de industrialização contida na legislação do IPI, temos que o exercício da panificação e revenda dos produtos resultantes para consumidor final é caracterizado, para fins do imposto estadual, como atividade comercial”.
O recorrente, por outro lado, apresenta a tese de que os conceitos de produto industrializado e de industrialização constantes do Regulamento do IPI (Decreto nº 7.212/2010) não se prestam a orientar as questões relativas ao creditamento de ICMS de energia elétrica.
Ocorre que, como visto do julgamento do Recurso Especial acima referenciado, o próprio STJ, em julgamento de casos idênticos, toma emprestados estes conceitos, por configurarem a exata medida do que se considera produto industrializado. Observemos:
“(...) 11. A tese genérica de que o contribuinte tem direito ao creditamento de ICMS se comprovar ter utilizado a energia elétrica "no processo de industrialização", ex vi do disposto no artigo 33, II, "b", da Lei Complementar 87/96, foi consagrada pela Primeira Seção, no âmbito de embargos de divergência interpostos por estabelecimento industrial (EREsp 899.485/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, julgado em 13.08.2008, DJe 15.09.2008).
12. O parágrafo único, do artigo 46, do CTN, ao versar sobre o IPI, considera industrializado o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo.
13. Nada obstante, as normas previstas no Regulamento do IPI (Decreto 4.544/2002) afastam a caracterização das atividades de panificação e congelamento de alimentos como industriais.
14. Com efeito, o artigo 3º, do aludido regulamento, preceitua que "produto industrializado é o resultante de qualquer operação definida neste Regulamento como industrialização, mesmo incompleta, parcial ou intermediária".
15. As características e modalidades de industrialização restaram elencadas no artigo 4º, do Decreto 4.544/2002, verbis: "Art. 4º Caracteriza industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para consumo, tal como (Lei nº 4.502, de 1964, art. 3º, parágrafo único, e Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, art. 46, parágrafo único): I - a que, exercida sobre matérias-primas ou produtos intermediários, importe na obtenção de espécie nova (transformação); II - a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto (beneficiamento); III - a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal (montagem); IV - a que importe em alterar a apresentação do produto, pela colocação da embalagem, ainda que em substituição da original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria (acondicionamento ou reacondicionamento); ou V - a que, exercida sobre produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização (renovação ou recondicionamento).
Parágrafo único. São irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado para obtenção do produto e a localização e condições das instalações ou equipamentos empregados." 16. O aludido regulamento, por seu turno, enumera as operações que não são consideradas industrialização, entre as quais consta: "I - o preparo de produtos alimentares, não acondicionados em embalagem de apresentação: a) na residência do preparador ou em restaurantes, bares, sorveterias, confeitarias, padarias, quitandas e semelhantes, desde que os produtos se destinem a venda direta a consumidor" (artigo 5º, inciso I, alínea "a", do Regulamento do IPI).
16. O aludido regulamento, por seu turno, enumera as operações que não são consideradas industrialização, entre as quais consta: "I - o preparo de produtos alimentares, não acondicionados em embalagem de apresentação: a) na residência do preparador ou em restaurantes, bares, sorveterias, confeitarias, padarias, quitandas e semelhantes, desde que os produtos se destinem a venda direta a consumidor" (artigo 5º, inciso I, alínea "a", do Regulamento do IPI).
17. O regulamento do IPI, em seu artigo 6º, incisos I e II, esclarece que embalagem de apresentação não se confunde com o acondicionamento para transporte do produto.
18. Conseqüentemente, a atividade de panificação, desenvolvida pelo supermercado, não se afigura como "processo de industrialização", à luz do disposto no artigo 46, do CTN, em virtude da exceção prevista no artigo 5º, inciso I, alínea "a", do Decreto 4.544/2002, que se apresenta como legislação tributária hígida.
19. A atividade de congelamento de alimentos, por seu turno, não se amolda aos critérios estabelecidos no artigo 4º, do regulamento citado. (...)”
Frise-se que o julgamento acima transcrito se deu no ano de 2009, quando ainda era vigente o Decreto 4.544/2002, posteriormente revogado, em 15 de junho de 2010, pelo Decreto 7.212/2010. O novo diploma, por seu turno, manteve iguais os dispositivos indicados no Acórdão do Julgamento do REsp 1117139/RJ, especificamente nos seus artigos 3º, 4º, 5º, inciso I, alínea “a” e 6º, perfeitamente aplicáveis ao caso em análise.
Assim, por não configurarem atividades industriais, afigura-se irregular o aproveitamento do benefício previsto no art. 72, §1º, II, “b”, do RICMS/PB, tornando necessário confirmar-se correto o procedimento da auditoria, indicando como infração ao RICMS/PB a utilização dos créditos advindos das aquisições de energia elétrica para utilização no processo produtivo da empresa.
INDICAR COMO NÃO TRIBUTADAS PELO ICMS OPERACOES COM MERCADORIAS OU PRESTACOES DE SERVICOS SUJEITAS AO IMPOSTO ESTADUAL
Para a segunda infração, verifica-se que se trata de mercadorias sujeitas à tributação, cujas vendas teriam sido tratadas como se fossem isentas do ICMS, tendo em vista o fato de os documentos fiscais relativos a essas operações tributadas as terem indicado como se fossem isentas.
Com relação a essa acusação, sobre a qual a recorrente solicita a nulidade do lançamento de ofício, ao fundamento da existência de erro decorrente do fato de alguns produtos, constantes na planilha fiscal que consigna as mercadorias/produtos, objeto da operação tributada, e consideradas pela recorrente como isentas, não terem sido identificados como deveriam, mas, sim, com uma referência genérica denominada “Seção de Preço”, em verdade não há o que reparar no respectivo lançamento de ofício.
Com efeito, considerando que a Fiscalização promoveu a apuração da situação fiscal da recorrente com base nos registros constantes na sua EFD, esta, sim, deveria trazer a identificação da mercadoria vendida como isenta, a fim de demonstrar a regularidade da operação, afinal, tratando-se de isenção objetiva, i.e., aquela que incide sobretudo sobre o produto, é imprescindível que a EFD o identifique nos seus registros, sob pena de se considerar a operação tributada.
Destarte, não é demais lembrar a norma jurídica de isenção objetiva estabelece uma inversão na fenomenologia jurídica aplicável às isenções subjetivas. Isto porque o efeito da isenção objetiva incide sobre o beneficiário apenas de forma reflexa. Nesse sentido a lição de José Souto maior Borges, segundo a qual “não sendo instituídas por considerações pessoais [as isenções objetivas] tem como alvo direta e imediatamente certos bens, atos ou situações e só indireta e mediatamente alcança as pessoas beneficiadas. Isto porque a relação tributária é sempre pessoal.” (Op. Cit., 1ª ed., São Paulo, Sugestões Literárias, 1969, p. 257/258).
Considerando que a regra é a tributação, enquanto a isenção é a exceção, por consequência o sujeito passivo deve demonstrar a circunstância e/ou o objeto motivadores do direito à isenção fiscal.
A imprescindibilidade de o sujeito passivo promover a identificação da mercadoria objeto da operação que considerou isenta advém, inclusive, do fato de que a isenção objetiva pode cumulativamente ser condicionada. Afinal, a isenção deve ser interpretada conforme a literalidade da lei isentiva (interpretação do art. 111, II, do CTN).
No caso, ao não identificar na sua EFD a mercadoria objeto das operações de vendas que considerou isentas nas operações que promoveu, a recorrente deixou de demonstrar que essas operações estavam de fato dispensadas do pagamento do ICMS sobre elas incidente.
Isto considerando, não subsiste dúvidas quanto à regularidade do procedimento utilizado pela fiscalização.
Por outro lado, a fiscalização incluiu no Levantamento Quantitativo os valores relativos aos produtos que não são objetos de venda pela autuada, e sim de seu próprio consumo ou para seu ativo, não podendo, estes, servir de base para a aplicação da técnica de auditoria ora em análise. Tais itens não devem compor a base de cálculo do ICMS devido, de maneira que faço a sua devida exclusão, conforme tabela abaixo:
Exercício |
CD_ITEM |
DS_ITEM |
BC_DIFERENCA |
ICMS_DEVIDO_ |
MULTA ART. 82, IV |
2010 |
1-000005300215 |
PALLET MAD PBR B 266 |
52016,06 |
8842,73 |
6632,0475 |
2010 |
1-000005300266 |
PALLET MADEIRA PBR B-210 |
7834,32 |
1331,83 |
998,8725 |
2010 |
1-000005300355 |
PALLET MADEIRA PBR B-267 |
10448,33 |
1776,22 |
1332,165 |
2010 |
1-000005300398 |
PALLET CHEP AZUL |
11699,4 |
1988,9 |
1491,675 |
2010 |
1-000005300401 |
PALLET CHEP AZUL |
437,8 |
74,43 |
55,8225 |
2010 |
1-000005300681 |
CAMISAO TERMICO 180X 88X115 |
66502,02 |
11305,34 |
8479,005 |
2010 |
3-000005500010 |
SACO PL FULL VAC 18X 26X15 C/1000 |
1363,12 |
231,73 |
173,7975 |
2010 |
3-000005500125 |
SACOLA FARM TD 30X40 X25 C/ 1000 |
226,04 |
38,43 |
28,8225 |
2010 |
3-000005500559 |
SACO PL FULL VAC 25X 32X15 C/1000 |
840,48 |
142,88 |
107,16 |
2010 |
3-000005504490 |
SACOLA T DIA 36/38X 50X25 C/2000 |
22214,28 |
3776,43 |
2832,3225 |
2010 |
3-000005800200 |
S.PL LISO PERF 22X50 X50 C/1000 |
872,78 |
148,37 |
111,2775 |
2010 |
3-000005800226 |
SC PL IMP 22X50X40 PAO C/1000 |
371,74 |
63,19 |
47,3925 |
2010 |
3-000005800307 |
SC PL IMP 24X33X40 PAO C/1000 |
191,17 |
32,5 |
24,375 |
2010 |
3-000005801532 |
S.PL IMP 12X33X40 F ROSCA C/1000 |
95,55 |
16,24 |
12,18 |
2010 |
3-000005501237 |
SC PL RECEPCAO 50X70 X 35 C/1000 |
601,77 |
102,3 |
76,725 |
TOTAL: |
29871,52 |
22403,64 |
|||
|
|||||
CRÉDITO TRIBUTÁRIO CANCELADO: |
52275,16 |
Assim, cancelo o crédito tributário no valor de R$ 52.275,16 (cinquenta e dois mil, duzentos e setenta e cinco reais e dezesseis centavos), relativo à acusação de indicar como isentas de ICMS operações com mercadorias ou serviços sujeitos ao imposto estadual exclusivamente quanto aos itens acima listados.
VENDAS SEM EMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO FISCAL
Para a terceira infração, de vendas sem emissão de documentos fiscais, como se sabe, o levantamento quantitativo de mercadorias é um procedimento fiscal destinado a conferir as entradas e saídas de mercadorias do estabelecimento de contribuinte, num determinado período, tomando-se como pontos de referência os inventários inicial e final do período considerado.
Assim, constatada a ocorrência de que as disponibilidades, expressadas pelas compras do contribuinte, no período considerado, mais o estoque inicial do período, foram superiores às vendas realizadas mais o estoque existente no final do período, comprova-se a ocorrência de vendas de mercadorias desacompanhadas de documentação fiscal, em desrespeito aos artigos 158 e 160 do RICMS-PB, abaixo transcritos:
Art. 158. Os contribuintes, excetuados os produtores agropecuários, emitirão Nota Fiscal, modelos 1 ou 1-A, Anexos 15 e 16:
I - sempre que promoverem saída de mercadorias;
Art. 160. A nota fiscal será emitida:
I - antes de iniciada a saída das mercadorias.
No caso em exame, a empresa foi autuada por Vendas sem Emissão de Documentação Fiscal, conforme demonstrativo constante nos autos à fl.23 e mídia digital, tendo comparecido aos autos arguindo a existência de incongruências nas informações prestadas em relação às operações realizadas, as quais consistiriam de erro nos códigos dos produtos levados a efeito no procedimento fiscal, visto que a entrada dos produtos seria escriturada como um código diferente do registrado na saída em função da diversidade na forma de revenda em comparação com a compra (atacado x varejo).
Assim, diz que a auditoria não atentou para o fato de que os produtos comestíveis, em geral, são adquiridos em peças que depois retalhadas para a revenda, havendo, portanto, o desmembramento em subprodutos com atribuição de código distinto. E que também não foram consideradas as perdas normais no processo de armazenamento, expedição e distribuição dos produtos comercializados.
Ora, tais argumentações não encontram espaço para prosperar, tendo em vista que os dados coletados decorrem de informações prestadas pelo próprio contribuinte através da sua Escrituração Fiscal Digital - EFD que, por força normativa, veio a substituir a documentação representada em meio físico (papel), mas, identicamente a este, possui força probante a prol do contribuinte, da qual é possuidor.
Neste sentido, o Decreto nº 30.478/2009, que estabeleceu a obrigatoriedade da adoção da EFD, neste Estado, recepcionando, pois, a legislação federal vigente, dispõe sobre a composição e a utilidade das informações fiscais prestadas mediante esse meio, conforme se infere da dicção do § 1º, do art. 1º, in verbis:
Art. 1º (...)
§ 1º. A escrituração Fiscal Digital – EFD compõe-se da totalidade das informações em meio digital, necessárias à apuração do imposto referente às operações e prestações praticadas pelo contribuinte, bem como outras de interesse do fisco.
Donde se infere que é do contribuinte a responsabilidade pela certeza e fidedignidade das informações assentadas na sua EFD, afinal essas informações são, por ele, prestadas. E para que tenha força probante a seu prol, necessário que a EFD atenda às disposições regulamentares.
Assim, o Guia Prático da Escrituração Fiscal Digital assim dispõe sobre o código dos itens objeto da atividade econômica do contribuinte:
REGISTRO 0200: TABELA DE IDENTIFICAÇÃO DO ITEM (PRODUTO E SERVIÇOS)
Este registro tem por objetivo informar mercadorias, serviços ou quaisquer outros itens concernentes às transações fiscais. Quando ocorrer alteração somente na descrição do item, sem que haja descaracterização deste, ou seja, criação de um novo item, a alteração deve constar no registro 0205.
Só devem ser apresentados itens referenciados nos demais blocos, exceto se for apresentado o fato de conversão no registro 0220, (a partir de julho de 2012).
A identificação do item (produto ou serviço) deverá receber o código próprio do informante do arquivo em qualquer documento, lançamento efetuado ou arquivo informado (significa que o código de produto deve ser o mesmo na emissão dos documentos fiscais, na entrada das mercadorias ou em qualquer outra informação prestada ao fisco), observando-se ainda que:
a) O código utilizado não pode ser duplicado ou atribuído a itens (produto ou serviço) diferentes. Os produtos e serviços que sofrerem alterações em suas características básicas deverão ser identificados com códigos diferentes. Em caso de alteração de codificação, deverão ser informados o código e a descrição anteriores e as datas de validade inicial e final no registro 0205;
b) ...........
c) ...........
d) A discriminação do item deve indicar precisamente o mesmo, sendo vedadas discriminações diferentes para o mesmo item ou discriminações genéricas (a exemplo de “diversas entradas”, “diversas saídas”, “mercadorias para revenda”, etc), ressalvadas as operações abaixo, desde que não destinada à posterior circulação ou apropriação na produção:
Pois bem, examinando os arquivos da EFD da recorrente, observou-se que as quantidades de mercadorias disponíveis para a revenda (EI + COMPRAS) superaram as vendas realizadas mais o estoque final (VENDAS + EF), inferindo-se a ocorrência de vendas sem o pagamento do imposto devido.
Ressalte-se, ainda, que não há qualquer vinculação desses produtos a um novo subproduto, objeto de desmembramento do original.
Relativamente às perdas de produtos, as quais teriam impossibilitado sua venda e que, entretanto, não teriam sido consideradas pela Fiscalização nos trabalhos referentes ao Levantamento Quantitativo, entendo que se trata de uma questão que envolve a materialidade do fato e, portanto, o estabelecimento que se depara com circunstâncias dessa natureza compete adotar as providências necessárias a prevenir prejuízos fiscais, quais sejam, promover a emissão de nota fiscal, com CFOP 5.927, para lançamento a título de baixa de estoque decorrente de perda, roubo ou deterioração, e efetuar a anulação dos créditos fiscais relativos à entrada das mercadorias objeto de sinistro (furto, roubo, extravio, deterioração, quebra normal) ou de qualquer outro evento que impossibilite a realização da operação posterior (art. 85, IV do RICMS/PB).
Isto considerando, não subsiste dúvidas quanto à regularidade do procedimento utilizado pela fiscalização, no entanto, entendo que não devem ser considerados no Levantamento Quantitativo os valores relativos aos produtos que não são objetos de venda pela autuada, e sim de seu próprio consumo ou para seu ativo, não podendo, estes, servir de base para a aplicação da técnica de auditoria ora em análise.
Assim, entendo como corretos os ajustes realizados pela julgadora monocrática a fim de afastar da denúncia tais itens, conforme demonstrado às fls. 310/311.
No tocante às penalidades aplicadas, a fiscalização, corretamente, cominou os percentuais previstos no art. 82, IV e V, “a” e “h”, da Lei n° 6.379/96, conforme as alterações introduzidas pela Lei nº 10.008/2013, como se segue:
Art. 82. As multas para as quais se adotará o critério referido no inciso II, do art. 80, serão as seguintes:
(...)
IV - de 75% (setenta e cinco por cento) aos que indicarem como isentas ou não tributadas, nos documentos fiscais, as operações ou prestações sujeitas ao imposto;
(...)
V - de 100% (cem por cento):
(...)
a) aos que deixarem de emitir nota fiscal pela entrada ou saída de mercadorias, de venda a consumidor ou de serviço, ou as emitirem sem observância dos requisitos legais;
(...)
h) aos que utilizarem crédito indevido ou inexistente, desde que resulte na falta de recolhimento do imposto, sem prejuízo do estorno do crédito;
Quanto à alegação da recorrente de que a multa aplicada se apresenta desproporcional e confiscatória, os agentes do Fisco atuaram nos limites da Lei n° 6.379/96 (Lei do ICMS da Paraíba) e do RICMS/PB (aprovado pelo Decreto n° 18.930/97), que são instrumentos normativos que devem ser observados.
Ao propor uma multa, o fazendário toma por base as determinações desses dispositivos legais. Desrespeitá-los consistiria numa ilegalidade, que não comporta lugar no ordenamento jurídico-administrativo paraibano.
Para se desconsiderar uma determinação legal, far-se-ia necessário analisar a sua inconstitucionalidade e como é sabido, não cabe aos Tribunais Administrativos adentrar nessa seara pretendida, nos termos do art. 55 da Lei nº 10.094/13 (PAT):
Art. 55. Não se inclui na competência dos órgãos julgadores:
I - a declaração de inconstitucionalidade;
Além do dispositivo supra, acrescento o disposto na Súmula nº 3 desta Corte Administrativa, ratificada pela Portaria nº 311/2019/SEFAZ, de 18 de novembro de 2019:
SÚMULA 03 – DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE - A declaração de inconstitucionalidade de lei não se inclui na competência dos órgãos julgadores administrativos.
Portanto, tanto os Fazendários como os Órgãos Julgadores Administrativos estão restritos ao que dispõe a lei que trata da matéria, em obediência aos Princípios Constitucionais Tributários da Vinculabilidade e da Legalidade, não cabendo a discricionariedade para a aplicação da penalidade, pretendida pela Recorrente.
Diante de tais constatações, só nos resta corroborar os termos da decisão singular, pelos seus próprios fundamentos, mantendo a parcial procedência do feito fiscal.
Por todo o exposto,
VOTO pelo recebimento do recurso voluntário, por regular e tempestivo, e, quanto ao mérito, pelo seu provimento parcial, para reformar a sentença monocrática e julgar parcialmente procedente, o Auto de Infração de Estabelecimento de nº 93300008.09.00002508/2014-93, lavrado em 20/02/2019, em face de BOMPREÇO SUPERMERCADOS DO NORDESTE LTDA., inscrição estadual nº 16.160.755-1, já qualificada nos autos, declarando devido o crédito tributário no valor de R$ 1.144.545,8 (um milhão, cento e quarenta e quatro mil, quinhentos e quarenta e cinco reais e oitenta centavos), sendo R$ 592.136,25 (quinhentos e noventa e dois mil, cento e trinta e seis reais e vinte e cinco centavos), referentes ao ICMS devido, mais R$ 552.409,55 (quinhentos e cinquenta e dois mil, quatrocentos e nove reais e cinquenta e cinco centavos), de multa por infração, cuja previsão legal está disposta no artigo 82, incisos IV e V, alíneas “a” e “h”, todos da Lei 6.379/96
Cancelo, pelos motivos expostos, o crédito tributário no valor de R$ 52.275,16 (cinquenta e dois mil, duzentos e setenta e cinco reais e dezesseis centavos), sendo R$ 29.871,52 (vinte e nove mil, oitocentos e setenta e um reais e cinquenta e dois centavos) de ICMS e R$ 22.403,64 (vinte e dois mil, quatrocentos e três reais e sessenta e quatro centavos) de multa por infração.
Frise-se, oportunamente, que o contribuinte realizou o recolhimento de ICMS de parte dos lançamentos realizados pela fiscalização, conforme comprovantes anexos às fls. 86/146 e consulta ao Sistema ATF, valor que deverá ser excluído do crédito tributário devido.
[1] Arquivo digital: Doc. 02 – Laudo de Energia Elétrica.pdf (portable document format), tamanho: 1.992kb, datado de 30/06/2014, assinado por Rodrigo Kawatake Padovan, CREA/SP nº 5062275051.
[2] REsp 1117139/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/11/2009, DJe 18/02/2010. Tema Repetitivo 242, com trânsito em julgado em 19/10/2010.
Primeira Câmara de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 30 de novembro de 2020.
MAÍRA CATÃO DA CUNHA CAVALCANTI SIMÕES
Conselheira Relatora
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