ACÓRDÃO Nº.289/2018
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
Processo nº1543232014-2
PRIMEIRA CÂMARA DE JULGAMENTO
1ªRecorrente:GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS-GEJUP
1ªRecorrida:GOMES PAIXÃO & CIA. LTDA.
2ªRecorrente:GOMES PAIXÃO & CIA. LTDA.
2ªRecorrida:GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS GEJUP
Repartição Preparadora:SUBG. DA RECEBEDORIA DE RENDAS DA GER.REG.1ª REGIÃO
Autuante:ALEXANDRE JOSE LIMA SOUSA.
Relator:CONSº.ANÍSIO DE CARVALHO COSTA NETO
PRESUNÇÃO DE OMISSÃO DE SAÍDAS TRIBUTÁVEIS PRETÉRITAS AUTORIZADA LEGALMENTE PELA FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. MANTIDA DECISÃO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA.
Por disposição legal, infere-se que a conduta infratora de não lançar nos livros próprios as notas fiscais de aquisição impõe ao autuado a presunção de omissão de saídas tributáveis pretéritas com o fito de fazer jus à despesa com as referidas compras, com a obrigação da lavratura do lançamento de ofício para cobrança do imposto devido. Afastada parte da acusação em função das provas acostadas ao processo.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros da Primeira Câmara de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade, e de acordo com o voto do relator, pelo pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e do voluntário, por regular e tempestivo e, quanto ao mérito, pelo DESPROVIMENTO de ambos para manter os valores da sentença monocrática, e julgar PARCIALMENTE PROCEDENTE o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001681/2014-74, lavrado em 19/9/2014, em desfavor da empresa GOMES PAIXÃO & CIA. LTDA., inscrição estadual nº 16.129.923-7, já qualificada nos autos, declarando devido o crédito tributário no valor de R$ 11.032,92 (onze mil e trinta e dois reais), sendo R$ 5.516,46 (cinco mil, quinhentos e dezesseis reais e quarenta e seis centavos) de ICMS, por infração aos arts. 158, I, e. 160, I, c/c art. 646, todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto n° 18.930/97 e mais R$ 5.516,46 (cinco mil, quinhentos e dezesseis reais e quarenta e seis centavos) de multa por infração aos artigos 82, V, “f”, da Lei n° 6.379/96.
Ao tempo em que cancela por indevido o valor de R$ 72.779,60 (setenta e dois mil, setecentos e setenta e nove reais e sessenta centavos), sendo R$ 28.008,54 (vinte e oito mil e oito reais e cinquenta e quatro centavos) de ICMS, R$ 28.008,54 (vinte e oito mil e oito reais e cinquenta e quatro centavos), de multa por infração e mais R$ 16.762,52 (dezesseis mil, setecentos e sessenta e dois reais e cinquenta e dois centavos) de multa por reincidência.
P.R.I
Primeira Câmara de Julgamento, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 29 de junho de 2018.
Anísio De Carvalho Costa Neto
Conselheiro Relator
Gianni Cunha da Silveira Cavalcante
Presidente
Participaram do presente julgamento os Conselheiros da Primeira Câmara de Julgamento, GÍLVIA DANTAS MACEDO, REGINALDO GALVÃO CAVALCANTI e THAÍS GUIMARÃES TEIXEIRA.
Assessora Jurídica
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RELATÓRIO |
Examinam-se neste Colegiado os recursos voluntário e hierárquico, nos moldes dos artigos 77 e 80, respectivamente, da Lei nº 10.094/2013, diante do inconformismo da autuada com a sentença prolatada na instância prima que considerou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001681/2014-74, lavrado em19/9/2014, no qual consta a seguinte infração fiscal:
“FALTA DE LANÇAMENTO DE N. F. DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS – Aquisição de mercadorias com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido, constatada pela falta de registro de notas fiscais nos livros próprios.”
Foram dados como infringidos os artigos 158, I, 160, I, c/fulcro no art. 646, todos dispostos no RICMS/PB, aprovado pelo Decreto n° 18.930/97. O crédito tributário proposto foi de R$ 83.812,52, sendo R$ 33.525,00, de ICMS, R$ 33.525,00, de multa por infração e mais R$ 16.762,52 de multa por reincidência da infração supostamente cometida.
O fiscal autuante anexou relação de notas fiscais, com suas respectivas chaves de acesso, com base na qual efetivou a lavratura do auto de infração, objeto deste processo.
Regularmente cientificado por A. R. (pag. 24), em 20/11/2014, a empresa autuada apresentou reclamação em 19/12/2014, na qual se insurge contra os termos da autuação com base nas seguintes argumentações:
- que não reconhece parte das notas fiscais relacionadas pela fiscalização;
- que a autuada realizou notificação extrajudicial contra os emitentes dos referidos documentos não reconhecidos;
- que recebeu resposta de alguns desses fornecedores, uns alegando ter emitido notas de retorno, outros, de cancelamento;
- que outros emitentes não se manifestaram, não justificando o faturamento supostamente indevido;
- que o silêncio dos emitentes ratifica a inexistência da operação comercial;
- que o descumprimento da obrigação acessória não pode ser imputado à autuada;
- que expediu requerimento comunicando dando ciência do desconhecimento dos referidos documentos fiscais;
- que as notas fiscais de n. º s 1955071, 1955072, 1955073, foram lançadas no SPED de julho e a de n. º 158182 no SPED de agosto do ano de 2013;
Por fim, reclama pela improcedência do referido auto de infração, em conformidade com a legislação em vigor.
Com remessa dos autos a GEJUP, com distribuição ao Julgador Paulo Eduardo de Figueiredo Chacon, este exarou sentença considerando o auto de infração PARCIALMENTE PROCEDENTE, conforme ementa abaixo:
NOTAS FISCAIS DE ENTRADA NÃO LANÇADAS – OMISSÃO DE SAÍDAS PRETÉRITAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – DENÚNCIA CONFIGURADA.
- A alegação de desconhecimento das notas fiscais não é capaz de ilidir a penalidade imposta na ação fiscal, pois cabe ao contribuinte o ônus da prova para a desconstituição do lançamento.
- A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios conduz à presunção de saídas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto estadual, nos termos do artigo 646 do RICMS/PB.
AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Cientificado da decisão de primeira instância administrativa, através de A. R., em 20/6/2017 (pag. 280), o autuado apresentou recurso voluntário ao Conselho de Recursos Fiscais em 17/7/2017 (pag. 281) no qual alega o seguinte:
- que há provas da inexistência do negócio jurídico e que a empresa jamais efetuou as compras relacionadas pela fiscalização;
- que não deu causa à emissão das notas fiscais;
- que o processo deve ter observância ao princípio da verdade material e que deveria, a fiscalização, ter acostado a prova da escrituração das notas fiscais de quem as emitiu, sendo necessária a remessa dos autos, por isso, à instância primária para nova decisão, em observância à ampla defesa e ao contraditório;
- que houve inobservância aos princípios do processo legal, não tendo ocorrido fato gerador, não se podendo falar em lançamento de tributo e nem em cumprimento de obrigações acessórias, se constatando que houve contradição na decisão a quo, já que improcedeu R$ 72.779,60 e ainda manteve crédito tributário no valor de R$ 11.032,92;
- que é impossível deduzir quais as notas fiscais que foram reconhecidas como não lançadas e lançadas, tendo os fornecedores emitido declaração de que não houve o recebimento das mercadorias por parte do estabelecimento da recorrente;
- que não pode, o recorrente, ser autuado pelo descumprimento de obrigações acessórias;
- que a verdade se baseia nos equívocos das empresas que emitiram as aludidas notas fiscais em desfavor da recorrente;
- que a lei deve ser interpretada em favor do contribuinte;
Além das alegações já referidas, requer o contribuinte, através de advogado legitimamente constituído, conforme procuração anexada aos autos, que seja deferida intimação para a sustentação oral, assim como que as intimações sejam dirigidas exclusivamente ao advogado Acrísio Notônio de Oliveira Soares, OAB-PB 16.853.
Por fim, pugna pela reforma da decisão “a quo”, com a declaração de improcedência do auto de infração com base em todas as alegações feitas por ocasião da oportunidade recursal que fez questão de não perder.
Na sequência, os autos foram remetidos a esta Casa, com distribuição a esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, para o fim de apreciação e julgamento.
Este é o relatório.
VOTO |
Trata-se de recurso voluntário e hierárquico interposto contra decisão de primeira instância que julgou parcialmente procedente o Auto de Infração de Estabelecimento n.º 93300008.09.00001681/2014-74 lavrado em 19/9/2014 (fl. 3-4) em desfavor da empresa GOMES PAIXÃO & CIA. LTDA., devidamente qualificada nos autos.
Em primeira análise, cabe observar que o lançamento fiscal observou, de forma rigorosa, as disposições do art. 142 do CTN, não importando qualquer pretensão de nulidade referente às hipóteses elencadas nos arts. 14, 16 e 17, da Lei nº 10.094/2013 (Lei do PAT), em conformidade com o seguinte:
CTN.
Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Lei do PAT.
Art. 14. São nulos:
I - os atos e termos lavrados por pessoa incompetente;
II - os despachos e decisões proferidas por autoridade incompetente;
III - os lançamentos cujos elementos sejam insuficientes para determinar a matéria objeto da exigência tributária e o respectivo sujeito passivo, ressalvada, quanto à identificação deste, a hipótese de bens considerados abandonados;
IV - os despachos e as intimações que não contenham os elementos essenciais ao cumprimento de suas finalidades;
V - os autos de infração de estabelecimentos lavrados pelos auditores fiscais tributários estaduais de mercadorias em trânsito.
Art. 16. Os lançamentos que contiverem vício de forma devem ser considerados nulos, de ofício, pelos Órgãos Julgadores, observado o disposto no art. 15 desta Lei.
Art. 17. Está incluído na hipótese prevista no art. 16 desta Lei, o Auto de Infração lavrado em desacordo com os requisitos obrigatórios estabelecidos no art. 142 do Código Tributário Nacional, quanto:
I - à identificação do sujeito passivo;
II - à descrição dos fatos;
III - à norma legal infringida;
IV - ao nome, ao cargo, ao número de matrícula e à assinatura do autor do feito;
V - ao local, à data e à hora da lavratura;
VI - à intimação para o sujeito passivo pagar, à vista ou parceladamente, ou impugnar a exigência, no prazo de 30 (trinta) dias, contado a partir da data da ciência do lançamento.
Constata-se que o litígio administrativo versa sobre matéria bastante conhecida para aqueles que labutam no ramo do direito tributário no Estado da Paraíba, qual seja, lavratura de auto de infração por ocasião do cometimento do ilícito de não lançar, nos livros próprios, as notas fiscais de aquisição de mercadorias.
Assim, é bem sabido que o ato de não registrar nos livros próprios os documentos de aquisição de mercadorias, em regra, acarreta consequências que dizem respeito tanto à obrigação principal de recolher o ICMS quanto à obrigação acessória de efetuar o registro das notas fiscais no respectivo Livro Registro de Entradas e, como já dito, de tratativas recorrentes na corte administrativa de segundo grau.
Com relação ao mérito das questões aqui enfrentadas, pode-se dizer que a condição de contribuinte do ICMS no Estado da Paraíba impõe a todos enquadrados em tal situação uma série de obrigações, sejam de natureza principal, sejam de natureza acessória. Uma das quais é o efetivo e regular lançamento, nos livros próprios, das notas fiscais de aquisição de mercadorias no respectivo Livro Registro de Entradas.
Aliás, a escrituração do referido livro é de obrigatoriedade só excepcionada para específicos contribuintes que, em condição de hipossuficiência, situam-se em condição especial, o que para o denunciado não ocorre. Assim, persiste, para ele, a obrigatoriedade de escriturar o referido livro, nele devendo, obrigatoriamente, lançar todas as notas fiscais de compra de mercadoria – tributáveis ou não. É inteligência que se depreende do artigo 267 do RICMS:
Art. 267. Os contribuintes e demais pessoas obrigadas à inscrição deverão manter, em cada um dos estabelecimentos, os seguintes livros fiscais de conformidade com as operações que realizarem:
I - Registro de Entradas, modelo 1;
II - Registro de Entradas, modelo 1-A; (grifo nosso)
III - Registro de Saídas, modelo 2;
IV - Registro de Saídas, modelo 2-A;
V - Registro de Controle da Produção e do Estoque, modelo 3;
VI - Registro de Impressão de Documentos Fiscais, modelo 5;
VII - Registro de Utilização de Documentos Fiscais e Termos de
Ocorrências, modelo 6;
VIII - Registro de Inventário, modelo 7;
IX - Registro de Apuração do ICMS, modelo 9;
X - Livro de Movimentação de Combustíveis;
XI – Livro Caixa.
Ora, a obrigatoriedade de escrituração do Livro Registro de Entradas envolve outra obrigação: a de manter nele todos os registros de aquisição de mercadorias com a qual o contribuinte transacione em referido período, de acordo com o que estabelece o artigo 276 do RICMS:
Art. 276. O Registro de Entradas, modelos 1 ou 1-A, Anexos 24 e 25, destina-se à escrituração do movimento de entradas de mercadorias, a qualquer título, no estabelecimento e de utilização de serviços de transporte e de comunicação. (grifo nosso)
Da parte grifada do texto extrai-se que a obrigatoriedade se estende a qualquer tipo de aquisição, não importando se a aquisição se destina à revenda, ativo fixo ou consumo. Pouco importa. Adquiriu mercadorias ou contratou serviços, nasce a obrigação de lançar no livro registro de entrada. Assim, se algumas aquisições realizadas pelo autuado não se destinam à revenda, nada mais irrelevante, a presunção de que trata o artigo 646, destacado adiante, prevalece.
Ocorre que, no âmbito da legislação em vigor, a falta de lançamento de notas fiscais de aquisição de mercadorias tem consequência muito mais abrangente do que apenas a responsabilização pelo descumprimento da obrigação acessória. De acordo com o que estabelece o referido artigo:
Art. 646. Autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção:
I – o fato de a escrituração indicar:
a) insuficiência de caixa;
b) suprimentos a caixa ou a bancos, não comprovados;
II – a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes;
III – qualquer desembolso não registrado no Caixa;
IV – a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas;
V – declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito.
Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, bem como, a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados , quando da transferência ou venda, conforme o caso. (grifo nosso) (com redação vigente a partir de 23/06/2012)
Não é por menos que a indigitada presunção mereceu do legislador uma atenção especial, reforçando-a por disposição legal, mais especificamente no § 8º do artigo 2º da Lei 6.379/96:
Art. 3º O imposto incide sobre:
(...)
§ 8º O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa e bancos, suprimentos a caixa e bancos não comprovados ou a manutenção no passivo de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou de prestações de serviços sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção. (grifo nosso) (com redação a partir de 2011)
Há, portanto, efeitos que ultrapassam a mera consideração a respeito da falta de cumprimento de obrigação acessória. Impõe ao auditor a obrigação de lançar crédito tributário decorrente de omissão de saída pretérita de mercadorias tributáveis sempre que estiver diante da situação em que o contribuinte não lançar em sua escrita fiscal e contábil (se for o caso) notas fiscais de aquisição de mercadorias.
E aqui se faça uma correção a respeito da confusão conceitual feita pela recorrente a respeito da acusação de que é vítima. O recorrente não está sendo autuado pela falta de cumprimento de deveres instrumentais (“obrigação acessória”). Jamais. E essa confusão está explicitada no decorrer de todo o recurso, do qual extraio excerto:
“Como é cediço, trata-se de infração cujo objeto é a suposta omissão de entrada e de saídas de mercadorias do estabelecimento da recorrente, não havendo, assim, o recolhimento do tributo (ICMS) e, consequente, o não cumprimento das obrigações acessórias.”
E, malgrado a confusão teorética permeie de perigo o sucesso de seu recurso, o princípio da formalidade mitigada, que aflora no âmbito do processo administrativo tributário, impõe ao julgador uma tarefa muito mais elástica no seu mister de analisar e julgar seu recurso. E isso com o fito de tentar entender e extrair a compreensão do recorrente que do seu discurso monográfico se pode concluir, não obstante a anarquia conceitual.
Assim, é preciso esclarecer, como já delineado, de que ele está sendo acusado de omitir saídas tributáveis pretéritas em decorrência da constatação de que houve a falta de lançamento (registro fiscal ou contábil) de notas fiscais de aquisição nos livros próprios, a exemplo dos Livros Registro de Entradas, Livro Caixa etc.
Conforme demonstrado, portanto, a autuação diz respeito à obrigação principal, referente àquelas saídas pretéritas que foram omitidas com o fim de levantar recursos financeiros para suportar o ônus, também financeiro, das aquisições realizadas. Essas demonstradas na relação de documentos fiscais acostada aos autos às fls. 8-17. Essa é a presunção que, do texto do artigo 646 do RICMS, já destacado, se deve ser feita.
E em função dos devaneios jurídicos, se faça uma advertência adicional no entendimento do fim a que se presta a presunção autorizada pelo dispositivo em destaque: o que se cobra nesse caso não é o somatório das notas fiscais não lançadas. Não são as notas fiscais não lançadas em si o objeto da autuação. O que se tributa é o valor das saídas de mercadorias tributáveis omitidas em etapa anterior e cujo resultado das operações serviu de esteio para o pagamento das aquisições cujas entradas não foram registradas. A presunção é de saídas pretéritas ao pagamento das referidas notas fiscais.
Assim, ao contrário do que alega o contribuinte, há provas inequívocas de uma relação jurídica/comercial entre dois contratantes. Que documento teria mais força probante que uma nota fiscal a emprestar a um acordo entre partes a natureza de uma relação comercial de compra e venda, e, portanto, materializando um negócio jurídico? Posso me antecipar e responder: NENHUM.
E não importa alegar que nenhuma culpa pode ser atribuída a si decorrente dos atos preparatórios à emissão dos documentos fiscais colacionados pela fiscalização e acostados aos autos. Não em sede de processo administrativo tributário. Quando muito em sede de processo cível, momento em que poderá exercer seu direito de regresso contra quem supostamente tenha dado causa a qualquer prejuízo que deste processo seja decorrente.
Neste momento o que se discute é a ocorrência, ou não, do fato gerador do ICMS e se as provas acostadas aos autos são suficientes para dar sustentabilidade fática aos fundamentos em que se baseia o auto de infração. Nada mais. Por isso é que, mais do que em qualquer outra circunstância, o que se persegue no processo administrativo tributário é a observância estreita à verdade material.
E o duplo grau de jurisdição administrativo, como controle da legalidade que é, exerce essa função: a de resguardar estreita relação com esse princípio tão caro a ele, não sendo necessário, portanto, de acordo com as provas inseridas neste processo, de que se fosse buscar escrituração fiscal ou contábil do emitente. Os critérios da fiscalização foram observados em apreço às técnicas de que se utilizam os auditores para buscar a ocorrência do fato gerador.
E, no caso de documentos de aquisição não lançados nos livros próprios, a técnica é simplória. Basta que se acesse o sistema de tecnologia da informação desenvolvido pela Secretaria de Estado da Receita para que se consiga detectar a infração. De forma que caberia ao contribuinte o ônus de provar o contrário, o que, neste caso, só aconteceu parcialmente.
Portanto, diante do fato provado, como ocorreu parcialmente neste processo, de que não houve o lançamento seja no Livro Registro de Entrada seja no Livro Caixa seja em que qualquer outro livro fiscal ou contábil próprio estar-se diante da possibilidade de se concluir pela presunção autorizada em lei de que houve omissão de saídas tributáveis, em conformidade com o que prescreve o artigo 646 do RICMS já destacado.
Em outro plano, diferentemente do que alegou o contribuinte, houve observância estreita ao devido processo legal. Desde o início da contenda, quando o contribuinte teve a oportunidade de protocolar sua reclamação contra o auto de infração na Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais, a primeira instância de análise da legalidade dos lançamentos de ofício.
Aliás, de olho no devido processo legal, a Lei 10.094/13, que regulamenta o processo administrativo tributário, estabeleceu o duplo grau de jurisdição, do qual se aproveitou o recorrente em toda sua extensão, sendo garantida a ele a observância, por parte da administração, do princípio, motivo pelo qual não merece acolhida as argumentações a respeito de houve inobservância ao devido processo legal.
E, neste ponto, deve ser esclarecido ao contribuinte de que o que se exerce no duplo grau de jurisdição administrativa regulamentado pela referida lei é o controle de legalidade, em razão da qual tem competência os julgadores de primeira instância, assim como o Conselho de Recursos Fiscais, para afastar do contribuinte as acusações que, por qualquer razão, de fato ou de direito, não sejam procedentes.
Por esse motivo, não se pode argumentar sobre qualquer contradição no resultado do julgamento de primeira instância por ter exarado sentença de procedência parcial do auto de infração e nem manutenção de crédito tributário, como resultado da análise das provas acostadas aos autos. Ora, o que o julgador realizou foi o já referido controle da legalidade. Ao se deparar com as provas do processo, observou que parte do crédito tributário levantado não era procedente, motivo pelo qual afastou parte, mas manteve a parte que contra ele não apresentou contraprovas o contribuinte. Esse é procedimento de competência dos órgãos de julgamento. Tudo em observância à legislação em vigor, de cuja ignorância a ninguém é dado do direito de alegar.
Neste diapasão, não merece acolhida também o argumento a respeito do qual seria impossível deduzir quais as notas fiscais foram reconhecidas como não lançadas ou lançadas. Aliás, as provas acostadas aos autos pela fiscalização e pelo contribuinte foram suficientes para que houvesse a inteira compreensão da prática da infração e de toda sua extensão, com as correções que foram feitas a partir das alegações do contribuinte.
No mesmo passo, a declaração de que não houve recebimento das mercadorias por parte dos emitentes das respectivas notas fiscais só faz prova entre os particulares, não podendo ser oposto à Fazenda Pública e não podendo ser prova de que não houve a circulação das mercadorias até o seu respectivo cancelamento (da nota fiscal), o que no caso não ocorreu para todos os documentos.
E não poderia ser diferente, resguardado na impossibilidade de, diante do fato de não ter lançado as notas fiscais, em clara inobservância às disposições legais relativas ao ICMS, fosse dado ao contribuinte o conforto de alegar seus próprios erros para se salvar do recolhimento do tributo devido, vendo prosperar as disposições do brocardo nemo auditur propriam turpitudinem allegans (ninguém é ouvido alegando a própria torpeza).
Em outro plano, é preciso que se esclareça que estamos diante de circunstâncias fáticas e de direito a conferir, com a lavratura do auto de infração, o nascimento de uma obrigação de natureza tributária que contra a qual se insurge o contribuinte. Resume-se, portanto, a questões de prova e de argumentos, mas não de interpretação de lei. A lei é clara e autoriza a presunção de omissão pretérita de saídas tributáveis diante do fato de falta de lançamento, nos livros fiscais e contábeis próprios, das notas fiscais de aquisição.
Assim, diante do fato de a escrituração indicar a falta de lançamento de documentos fiscais nos livros próprios, é condição suficiente para que se autorize a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis. Esta é consideração que converge para vasta jurisprudência administrativa do Conselho de Recursos Fiscais, cujo exemplo será demonstrado, em decisão recente:
Acórdão 148/2018
FALTA DE LANÇAMENTOS DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO NOS LIVROS PRÓPRIOS. PRESUNÇÃO LEGAL DE OMISSÃO DE SAIDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS. INFRAÇÃO CARACTERIZADA EM PARTE. AFASTADA MULTA RECIDIVA. JULGAMENTO PARCIALMENTE PROCEDENTE. MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO.
- Falta de lançamentos de notas fiscais de aquisição nos livros próprios caracteriza a presunção legal juris tantum de que houve omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis, sem o pagamento do imposto devido. No presente caso, o contribuinte apresentou provas documentais que desconstituíram parte do feito acusatório.
- Afastada a aplicação de multa recidiva, em consonância com o art. 87, parágrafo único, da Lei nº 6.379/96.
Portanto, da dicção do artigo 646 se extrai a certeza de que o mandamento autoriza a presunção, ao contrário do que o contribuinte alega em seu recurso, sendo certo que a presunção goza de natureza de relatividade, abraçando a prova em contrário, o que no caso só o fez parcialmente.
Assim sendo, cabe ao contribuinte a prova em contrário, seja por dispor de muito mais condições de fazê-lo, seja por ser o interessado com mais disposição sobre a documentação fiscal e contábil, reflexa do seu movimento diário de mercadorias, objeto de seu estatuto social; seja por gozar de presunção relativa, o lançamento tributário. Assim se posiciona o CRF em diversos julgados:
Recai sobre o contribuinte o encargo da prova negativa, quando o Fisco dispõe de documentos indicativos da aquisição, tais como, via da nota fiscal indicativa da operação. Com o documento fiscal o Fisco está provando a aquisição, acusando com prova documental, que, todavia, não é exaustiva, admitindo prova em contrário por parte do contribuinte, lastreada por documento. O denunciante retirou a acusação, relativa à diferença entre as saídas registradas e as declaradas para efeito do Imposto de Renda.
RECURSO DE OFÍCIO PARCIALMENTE PROVIDO
Processo nº CRF 217/98
Acórdão nº 4.410/98 - Decisão unânime de 01-07-1998
Relator: Cons. Moacir Tavares dos Santos.
Para além do recurso, portanto, não acostou, o contribuinte, qualquer outra prova relativa ao lançamento de ofício lavrado contra si, além daquelas acostadas a sua reclamação em sede de julgamento de competência da Gejup. Em primeiro plano, deve ser afastado o crédito relativo às notas fiscais de n. º s 3399 e 26774 que, como verificado também em primeira instância, houve declaração de deferimento, expedido pela própria Secretaria de Estado da Receita, do pedido de desconsideração dos referidos documentos fiscais das operações realizadas pelo contribuinte naquele período, conforme demonstrado na sentença exarada pelo julgador monocrático. (fl. 274)
Em outro plano, também deve ser excluído o crédito tributário relativo aos documentos que acobertam operações em que não há desembolso financeiro e para as quais a presunção prevista no artigo 646 não estaria autorizada exatamente por esse motivo. Além dessas, também devem ser excluídas as notas fiscais de n. º s 247899, 431833, 323658, 323659, 848247 e 207688 cujo cancelamento ou devolução das mercadorias o contribuinte também fez prova emprestada do processo 1543272014-0.
Por fim, deve se esclarecer a improcedência da acusação de reincidência, já que fica evidente que o contribuinte, pelos documentos acostados ao processo, não a cometera, conforme Termo de Antecedentes Fiscais à folha 268.
Por todo o exposto,
VOTO pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e do voluntário, por regular e tempestivo e, quanto ao mérito, pelo DESPROVIMENTO de ambos para manter os valores da sentença monocrática, e julgar PARCIALMENTE PROCEDENTE o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001681/2014-74, lavrado em 19/9/2014, em desfavor da empresa GOMES PAIXÃO & CIA. LTDA., inscrição estadual nº 16.129.923-7, já qualificada nos autos, declarando devido o crédito tributário no valor de R$ 11.032,92 (onze mil e trinta e dois reais), sendo R$ 5.516,46 (cinco mil, quinhentos e dezesseis reais e quarenta e seis centavos) de ICMS, por infração aos arts. 158, I, e. 160, I, c/c art. 646, todos do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto n° 18.930/97 e mais R$ 5.516,46 (cinco mil, quinhentos e dezesseis reais e quarenta e seis centavos) de multa por infração aos artigos 82, V, “f”, da Lei n° 6.379/96.
Ao tempo em que cancelo por indevido o valor de R$ 72.779,60 (setenta e dois mil, setecentos e setenta e nove reais e sessenta centavos), sendo R$ 28.008,54 (vinte e oito mil e oito reais e cinquenta e quatro centavos) de ICMS, R$ 28.008,54 (vinte e oito mil e oito reais e cinquenta e quatro centavos), de multa por infração e mais R$ 16.762,52 (dezesseis mil, setecentos e sessenta e dois reais e cinquenta e dois centavos) de multa por reincidência.
Primeira Câmara de Julgamento, Sala das Sessões, Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 29 de junho de 2018..
#NISIO DE CARVALHO COSTA NETO
Conselheiro Relator
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