Acórdão nº 399/2017
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA
PROCESSO Nº126.316.2014-3
Recurso HIE/CRF n.º 040/2016
Recorrente:GERÊNCIA EXECUTIVA JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS
Recorrida:TELEFÔNICA BRASIL S/A.
Preparadora:SUBGERENCIA DA RECEBEDORIA DE RENDAS DA GR1.
Autuante:MARIA J.LOURENÇO DA SILVA/FERNANDA CÉFORA V. BRAZ
Relator:CONS.JOÃO LINCOLN DINIZ BORGES
CRÉDITO INEXISTENTE. APROPRIAÇÃO SEM AMPARO DOCUMENTAL. INFRAÇÃO NÃO CARACTERIZADA. IMPROCEDÊNCIA. MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA. AUTO DE INFRAÇÃO IMPROCEDENTE. RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO.
Configuram créditos inexistentes aqueles constituídos sem amparo documental e em desacordo com a legislação do ICMS. In casu, ficou demonstrado nos autos que os créditos fiscais denunciados tiveram origem das alterações societárias, em que houve a sucessão pelo sujeito passivo de todos os direitos e obrigações do patrimônio cindido, havendo apropriação do saldo credor do ICMS remanescente da empresa cindida.
Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...
A C O R D A M os membros do Tribunal Pleno de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade, e de acordo com o voto do relator, pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, mantendo a decisão singular, que julgou improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.0000001293/2014-93, lavrado em 8 de agosto de 2014, contra TELEFÔNICA BRASIL S/A, CCICMS n° 16.136.950-2, eximindo-a de quaisquer ônus decorrentes desta ação fiscal.
Desobrigado do Recurso Hierárquico, na expressão do art. 84, parágrafo único, IV, da Lei nº 10.094/13.
P.R.E.
Tribunal Pleno, Sala das Sessões, Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 30 de agosto de 2017.
João Lincoln Diniz Borges
Cons. Relator
Gianni Cunha da Silveira Cavalcante
Presidente
Participaram do presente julgamento os Conselheiros do Tribunal Pleno, MARIA DAS GRAÇAS DONATO DE OLIVEIRA LIMA, JOÃO LINCOLN DINIZ BORGES, THAÍS GUIMARÃES TEIXEIRA, GILVIA DANTAS MACEDO, AUREA LUCIA DOS SANTOS SOARES VILAR (Suplente), DOMÊNICA COUTINHO DE SOUZA FURTADO, NAYLA COELI DA COSTA BRITO CARVALHO e DORICLÉCIA DO NASCIMENTO LIMA PEREIRA.
Assessora Jurídica
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R E L A T Ó R I O |
Em análise, neste egrégio Conselho de Recursos Fiscais, recurso hierárquico interposto contra decisão monocrática que julgou improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001293/2014-93, lavrado em 8 de agosto de 2014, sendo a empresa autuada acusada das irregularidades que adiante transcrevo:
FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS >> Falta de recolhimento do imposto estadual.
NOTA EXPLICATIVA:
A autuada, na qualidade de estabelecimento concessionário responsável pelo pagamento do imposto incidente sobre as prestações onerosas de serviços de telecomunicação efetuados neste estado, aproveitou crédito fiscal do ICMS sem amparo de documentação fiscal hábil. Ressalte-se que a empresa foi notificada (notificação nº 00047870/2014) a apesentar tal documentação, contudo nenhum documento fiscal foi entregue à fiscalização, apenas alegações fundadas na reestruturação societária da Telefônica Brasil S/A., que incorporou as empresas Vivo S/A., a Telecom S/A. e outras (ato societário registrado na JUCESP em sessão de 24/07/2013, sob o nº 279.089/13-2), afirmando que passou a se creditar dos valores do saldo credor que vem sendo acumulado dos períodos anteriores das empresas incorporadas. A resposta da empresa segue anexa aos autos.
Releva anotar que os valores objeto da presente autuação foram lançados na EFD – competências julho/2013 a dezembro/2013 nas rubricas demonstrativos dos outros créditos e dos outros débitos, conforme relatório de apuração do ICMS da EFD em anexo. Diante disso, fomos impelidas a realizar a reconstituição da conta corrente do ICMS, de acordo com o demonstrativo anexo, a fim de estornar os valores lançados a crédito e a débito desprovido de documento fiscal.
Cumpre ressaltar que nas hipóteses de transferência de saldo credor de ICMS devem ser observadas as regras contidas no art. 56 do RICMS/PB, que no caso presente não ocorreu. Além disso, devem ser atendidas as normas contidas nos arts. 72 e 77 do RICMS/PB quanto ao aproveitamento do crédito fiscal. (sic)
Por esta infração, a autuada ficou sujeita ao lançamento oficial fundamentado no artigo 106, do RICMS/PB, aprovado pelo Decreto 18.930/97, exigindo-se ICMS no valor de R$ 734.286,72, e multa por infração no montante de R$ 734.286,72, conforme sugere o artigo 82, inciso V, alínea “a” da Lei nº 6.379/96.
Sendo cientificada da autuação, por via postal, por meio de Aviso de Recebimento fls. 36, recepcionado em 16/09/2014, o contribuinte apresentou peça reclamatória tempestivamente em 16/10/2014, fls. 44 a 74, e anexos às fls. 75 a 244, por meio de seus representantes legais devidamente constituídos, que, em síntese, aborda os seguintes pontos em sua defesa:
- que, no âmbito de seu grupo societário, teria incorporado as empresas Telefônica Data S/A, Vivo S/A, Telecom S/A e Telefônica Sistema de Televisão S/A, sucedendo tais empresas em todos os seus direitos e obrigações;
- que a fundamentação legal da autuação, por falta de recolhimento do imposto estadual, estaria limitada à indicação genérica do art. 106 do RICMS/PB, o que provocaria nulidade do auto de infração por cerceamento do seu direito de defesa, se coadunando aos casos previstos no art. 14, III e art. 17, II e III da Lei nº 10.094/13;
- que as incorporações noticiadas teriam atendido a todas as formalidades exigidas pela legislação societária e fiscal, em especial o art. 223 e seguintes da Lei nº 6.404/1976, razão pela qual a impugnante teria sucedido as referidas empresas na totalidade de seus direitos e obrigações;
- que o saldo credor acumulado pelas incorporadas no período que antecedeu a incorporação foi automaticamente transferido à Impugnante, em razão dos efeitos jurídicos da operação societária, e que ultrapassariam meras regras formais de transferência de crédito, até mesmo as de cunho fiscal;
- que as sociedades absorvidas seriam sucedidas em todos os direitos e obrigações, conforme o art. 1.116 do Código Civil, e o art. 227 das Lei das Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/76);
- que em uma análise sistemática do princípio da não-cumulatividade, consubstanciado no art. 52 do RICMS/PB, concluir-se-ia que a incorporadora tem direito de utilizar os saldos credores de ICMS existentes na conta gráfica da incorporada, permitindo-lhe compensá-los com os débitos próprios em operações futuras;
- que por força da lei, teria assumido os livros fiscais das empresas incorporadas, citando o art. 273, do RICMS/PB, bem como os saldos credores de ICMS que lá estavam registrados;
- que teria sido apresentado à fiscalização o Registro Fiscal de Apuração do ICMS, informado no SPED (competência 06/2013), que comprovaria a existência de saldo credor nos livros fiscais da Telefônica Data S/A;
- que os artigos 2º e 5º do Decreto nº 20.275/1999, exige a centralização de sua escrituração fiscal em apenas um estabelecimento inscrito no CCICMS, em sua área de atuação, não sendo possível a emissão de nota fiscal de transferência de créditos de ICMS, pois teria sido absorvido integralmente os direitos e deveres das empresas incorporadas, e não se trataria de transferência de créditos entre estabelecimentos, uma vez se tratar de um único estabelecimento, ou seja, da própria Impugnante;
- que os valores utilizados pela Impugnante confeririam rigorosamente com o saldo credor discriminado e escriturado nos livros fiscais das incorporadas;
- que a multa proposta teria efeito confiscatório e desproporcional, requerendo a redução da mesma para 20% do valor do débito.
Ao final, requer acolhimento das preliminares de nulidade do Auto de Infração, a improcedência do mesmo, ou, ao menos, a redução da penalidade de 100% para 20% do valor do débito, além de juntada posterior de documentação comprobatória relevante ao deslinde da questão, à luz do princípio da verdade material.
Com informação de que não há registro de reincidência processual foram os autos conclusos e encaminhados à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais, tendo sido distribuídos para o julgador fiscal, Petrônio Rodrigues Lima, que sentenciou a questão pela improcedência do auto de infração, diante da comprovação da origem do crédito fiscal glosado pela fiscalização, conforme sentença exarada às fls. 248 a 260 dos autos.
Com ciência proferida em 17/12/2015 ao sujeito passivo do veredicto exarado na instância a quo, os autos tiveram remessa posterior a esta Casa, com distribuição para esta relatoria, segundo critério regimentalmente previsto, para o fim de apreciação e julgamento.
É o relatório.
V O T O |
Em pauta, recurso hierárquico decorrente de decisão da autoridade julgadora que improcedeu a exigência do crédito tributário lançado de ofício, diante da acusação de uso de crédito sem amparo de documentação fiscal hábil, oriundos de saldos credores acumulados de empresas incorporadas, cuja incorporação ocorrera em ato registrado na JUCESP sob o nº 279.089/13-2, em 24/07/2013, em que os valores foram lançados na EFD referente aos citados períodos de autuação, conforme demonstrativos às fls. 5 a 19 dos autos.
No tocante aos fundamentos que balizaram a decisão de improcedência do feito fiscal, não resta dúvida quanto à ocorrência da devida análise meritória da demanda processual que foram traçados dentro dos limites previstos em lei e nos aspectos de legitimidade e regularidade pautados pelo Regulamento do ICMS.
Como bem destacou o julgador singular, o que motivou a lavratura do Auto de Infração em tela foi a identificação de créditos fiscais apropriados na escrita fiscal do contribuinte, na rubrica “outros créditos para ajuste de apuração ICMS para PB – SALDO CREDOR REF. TDATA”, por falta de documentação fiscal de transferência de créditos, porém a defendente acostou aos autos, às fls. 107 a 244, documentação pertinente às alterações societárias realizadas e registradas pela JUCESP em 24/07/13, que justificaria a apropriação dos créditos fiscais denunciados.
No mérito, vejo acertada a fundamentação de decidir do julgador singular, que acolheu os reclamos da defesa, diante da comprovação e verificação de provas trazidas e atestadas nas atas das assembleias realizadas trazidas pelo contribuinte, que não houve uma incorporação da empresa Telefônica Data S. A. (TDATA) em sua totalidade, e sim uma cisão parcial da TDATA, cujo acervo líquido cindido foi sucedido pela empresa Telefônica Brasil S. A., cuja filial da Paraíba é a autuada em epígrafe.
Neste contexto, as citadas operações societárias foram formalizadas com a publicação em 3/7/2013 da Ata da 38ª Assembleia Geral Extraordinária no Diário Oficial Empresarial do Estado de São Paulo, realizada em 1°/7/2013, cuja finalidade foi de concentrar as atividades de prestação de serviços de telecomunicação na Telefônica Brasil S.A., e as demais ficando com a TDATA, em razão da impossibilidade legal daquela prestar serviços que não sejam de telecomunicação, conforme consta na mencionada Ata, fl. 112.
Tal fato foi devidamente atestado na análise das provas apresentadas às fl. 127, onde o acervo líquido cindido da TDATA foi incorporado pela Telefônica Brasil, compreendendo todos os ativos e passivos de suas empresas indicados no Laudo de Avaliação constante às fls. 131 a 134 dos autos, ficando evidenciado que a incorporadora sucederá a TDATA quanto aos seus direitos e obrigações do patrimônio cindido.
A matéria processual foi devidamente fundamentada pelo julgador singular, no qual passo a transcrever fragmento da sentença, que evidencia o deslinde da questão no tocante a falta de repercussão tributária não vislumbrada pela fiscalização, senão vejamos:
“diante da documentação trazida à baila pela Reclamante, houve a cisão parcial da empresa TDATA, em que todos os ativos e passivos das empresas prestadoras de serviços de telecomunicação foram sucedidos pela empresa Telefônica Brasil, como demonstra a falta de movimentação da filial da Paraíba em sua escrituração fiscal, CCICMS nº 16.144.284-6, a partir de julho/2013 (data do ato da cisão), e a apropriação dos créditos nela existentes em junho/2013 pela Reclamante (fls. 34), no valor de R$ 1.468.573,42, que, conforme valores lançados na sua escrituração fiscal digital, foram apropriados de forma parcelada, no valor de R$ 122.381,12, evidenciado às fls. 21 a 23, objeto da autuação até o mês de dezembro/2013”.
Na situação ora em debate há a cisão parcial de uma empresa, e a parte cindida, juntamente com os seus direitos e obrigações, é absorvida pelo contribuinte incorporador no momento da formalização do citado ato, não havendo, a partir do qual, o que se falar em transferências entre os estabelecimentos envolvidos e sim em sucessão, autorizada por lei.
Tal entendimento encontra arrimo em jurisprudência dominante nos tribunais judiciários e administrativos, sobre a matéria correlata, conforme citação abaixo:
Tanto o tributo quanto às multas a ele associadas pelo descumprimento da obrigação principal fazem parte do patrimônio (direitos e obrigações) da empresa incorporada que se transfere ao incorporador, de modo que não pode ser cingida a sua cobrança, até porque a sociedade incorporada deixa de ostentar personalidade jurídica.
(STJ, 1ª Seção, EDcl no REsp 923.012 MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 10/04/2013, publ. DJe 24/04/2013).
“... tanto as obrigações são transferidas para a empresa incorporadora, como também os direitos, ou seja, transferem-se ativo e passivo. Logo, a apropriação de saldo credor de ICMS existente na escrita fiscal da empresa incorporada é ato lícito e reflete o aspecto de "continuidade" das atividades da empresa incorporada”.
(Câmara Especial, PTA 01.000110339-81, Acórdão 2.043/00/CE, Relatora Cláudia Campos Lopes Lara, publ. 1/4/2000).
Diante da análise supra, comungo com o entendimento da decisão recorrida acerca da falta de materialidade para caracterização da repercussão tributária pretendida, pois a apropriação do saldo credor remanescente na escrita fiscal da empresa cindida, cujo patrimônio foi por ela absorvido na forma da lei societária, refletiu ato lícito, em razão do alcance universal da sucessão dos direitos e obrigações, já que a versão da parte cindida à empresa existente obedece às mesmas disposições legais previstas para a incorporação, nos termos do art. 229, §3º, da Lei nº 6.404/76.
Neste sentido, acertada foi a decisão de firmada pelo julgador monocrático pela inexigibilidade da denúncia.
Pelo exposto,
V O T O - pelo recebimento do recurso hierárquico, por regular, e quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, mantendo a decisão singular, que julgou improcedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.0000001293/2014-93, lavrado em 8 de agosto de 2014, contra TELEFÔNICA BRASIL S/A, CCICMS n° 16.136.950-2, eximindo-a de quaisquer ônus decorrentes desta ação fiscal.
Tribunal Pleno, Sala das Sessões Pres. Gildemar Pereira de Macedo, em 30 de agosto de 2017.
JOÃO LINCOLN DINIZ BORGES
Conselheiro Relator
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